:: Seu mega portal jurídico :: inicial | sobre o site | anuncie neste site | privacidade | fale conosco
        

  Canais
  Artigos
  Petições
  Notícias
Boletins informativos
Indique o
Escritório Online
 

Escritório Online :: Artigos » Direito Imobiliário


A posse e os bens imóveis

27/09/2000
 
Celso Marini



"Como Vimos que o homem sem lei é injusto e o respeitador da lei é justo, evidentemente todos os atos legítimos são, em certo sentido, atos justos; porque os atos prescritos pela arte do legislador são legítimos, e cada um deles, dizemos nós, é justo. Ora, nas disposições que tomam sobre todos os assuntos, as leis tem em mira a vantagem comum, quer de todos, quer dos melhores ou daqueles que detêm o poder ou algo desse gênero; de modo que, em certo sentido, chamamos justos aqueles atos que tendem a produzir e a preservar, para a sociedade política, a felicidade e os elementos que a compõem. E a lei nos ordena praticar tanto os atos de um homem corajoso (por exemplo, não desertar de nosso posto, nem fugir, nem abandonar nossas armas) quanto os de um homem morigerado (por exemplo, não cometer adultério, nem entregar-se à luxúria) e os de um homem calmo (por exemplo, não bater em ninguém, nem caluniar); e do mesmo modo com respeito às outras virtudes e formas de maldade, prescrevendo certos atos e ordenando outros; e a lei bem elaborada faz essas coisas retamente, enquanto as leis concebidas às pressas as fazem menos bem."
ARISTÓTELES - (384-322 a.C)

Há uma pessoa que possui o imóvel, ou exercita nele um direito real, porque obteve esse poder mediante um fato jurídico, isto é, registro do título translatício perante o Registro de Imóveis.
Esse direito tem os limites e sofre as restrições do direito anterior, dos quais se deriva. Se não tiver domínio o antecessor, não haverá transmissão; se o domínio ficar sujeito a qualquer condição, o direito do sucessor também terá que ser condicional. Os textos romanos fixam essas regras jurídicas em sentenças perfeitas de pensamento e expressão: "nua e imaginária" a alienação do que não se tem: - nemo plus iuris in alium transferre potest quam ipse habet; resoluto iure dantis resolvitur et ius concessum.

No ius possessionis, entretanto, o conteúdo do direito é a posse; defender-se-á essa relação da pessoa com a coisa, sem averiguação do direito.

A posse poderá ser legítima, ou ilegítima, e em qualquer caso esse ato terá efeitos jurídicos, variáveis segundo sua legitimidade e boa fé.

A posse, com explica FILOMUSI GUELFI, Dir. Reali, p. 275-277, é uma relação da pessoa sobre a coisa fundada na vontade individual, ao passo que a propriedade se assenta na vontade objetiva da lei.

Na posse se verifica um poder físico, enquanto na propriedade se manifesta um poder jurídico sobre coisas adquiridas e conservadas conformemente à lei.

Posse é uma apropriação de fato, e propriedade é uma apropriação de direito, como releva JOSSERRAND, Curso de Dir. Civil Positivo Francês, v. 1/721.

No ius possiendi se perquire o direito, ou qual o fato em que se estriba o direito que se argui, ou seja, a ação material sobre a coisa se efetua como conseqüência de um ato jurídico; e no ius possessionis não se atende senão à posse; somente essa situação de fato é que se considera, para que logre os efeitos jurídicos que a lei lhe confere.

Não se indaga então da correspondência da expressão externa com a substância, isto é, com a existência do direito. A lei socorre a posse enquanto o direito do proprietário não desfizer esse estado de coisas e se sobreleve como dominante.

O ius possessionis persevera até que o ius possiendi o extinga.


CONCEITO DE POSSE


A conceituação de posse tem variado de acordo com as doutrinas que se tem formulado a seu respeito. É tema de difícil compreensão, que tem desafiado os pensadores na sua solução, dentre eles, SAVIGNY e o seu discípulo e opositor RUDOLPH VON IHERING.

R.Limongi França relata

"Para o primeiro, 'tem-se a posse de uma coisa, quando se tem a possibilidade não somente de dispor dela fisicamente, mas ainda de a defender contra toda ação estranha' (Traité de la Possession", pg. 2 trad. de Staedtler 4ª ed., 1893). Já no entender do segundo, 'a posse é a exteriorização da propriedade', entendendo-se por tal o estado normal externo da coisa sobre o qual ela atinge sua destinação econômica de servir os homens' (Fondements des Interdits Possessoires' pg. 159, trad de Meulenare, 2ª ed., 1882.)

O nosso Código apresenta, inspirado em Ihering, um conceito legal de posse. Artigo 485: 'Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício pleno ou não, de algum dos poderes inerentes ao domínio, ou propriedade".

Segundo a disciplina de nossa Lei Civil, é possuidor quem se utiliza economicamente da coisa, seja com a intenção de dono, ou de apenas com o pensamento de utilizá-la economicamente.

Origem da posse


Na posse, o fato da apreensão de uma coisa, por parte da pessoa, como se fosse sua, remonta à própria origem do homem. A moderna Sociologia, sobretudo através da Escola Histórico-Cultural (V. Lemmonyer, Tonneau e Troude "Précis de Sociologie") fornece-nos elementos segundo os quais a propriedade particular de certos bens existe desde sempre e, naturalmente, antes do direito escrito a sua forma rudimentar foi a posse.

TEORIAS POSSESSÓRIAS


Há várias teorias acerca da posse. Declara uma delas que é possuidor somente quem detém fisicamente uma coisa corpórea.

Detém como se a coisa fora sua, ou com a intenção de dono. O elemento material da detenção a princípio, por uma interpretação estrita, se restringia ao contato físico, mais tarde alcançou uma compreensão maior, para compreender também a possibilidade da detenção. E o elemento intelectual que se limitava ao animus domini também se alongou, bastando a intenção de utilização da coisa possuída para que a posse tenha a proteção dos interditos.

Por interditos possessórios, devemos entender os instrumentos legais, postos em favor do possuidor, para defesa de sua posse.

Uma outra teoria possessória define como possuidor não só quem detenha fisicamente a coisa, com o intuito de utilizar-se dela, senão também quem exerce de fato um direito, ou quer exercê-lo.

A posse não se limitaria ao ius in re, ou ao domínio e direitos reais, mas atingiria até mesmo os direitos pessoais.

No Direito Pátrio, Rui Barbosa, foi um dos pioneiros a defender a tese de que a posse não se restringia, como antes de imaginava, apenas a tutelar direitos referentes a bens corpóreos (materiais), mas também aos bens incorpóreos (imateriais).

Teorias mais aceitas

SUBJETIVISTA DE POSSE

É de SAVIGNY, famoso jurista alemão (1779-1861). Mas foi pelo ano de 1893, que sua obra defendendo essa teoria, tornou-se conhecida. Segundo ele, "tem-se posse de uma coisa, quando se tem a possibilidade de dispor dela fisicamente, mas ainda de a defender contra toda ação estranha".

Para essa teoria, pois, propriedade é a posse e o uso da coisa como a pessoa quiser. É a afirmação de ter, é o gozo de ter, é ter por ter. A propriedade tem um fim em si.

OBJETIVISTA DE POSSE

É de Rudolph Von Ihering, jurista alemão (1818-1892). A pessoa, segundo ele, pode ter propriedade, como também o Estado. Pode ter terra, como propriedade, mas sendo basicamente um meio de produção. A propriedade passa a ser não só um bem pessoal, mas um bem produtor para a coletividade.

Para Ihering, aquela intenção de ter a coisa, o bem ou a propriedade para si, como afirma a teoria subjetivista, não tem importância. E, antes o que vale é o sentido de que a propriedade produza para a coletividade. Segundo esse doutrinador, o direito é o ordenamento das pessoas entre si e delas com as coisas. As pessoas e seus interesses, que devem ser protegidos. Mas, se a proteção desvirtua o fim a ser conseguido pela propriedade, qual seja, a convivência na ordem de paz, há interesses desprotegidos.

Por diversas vezes, os autores ao teorizarem sobre a posse, falam em propriedade, entretanto são situações que não se confundem, pois a primeira é a dominação fática sobre a coisa, e a segunda é dominação sobre a coisa, através de relação de direito.

O Estado deve pois, incentivar a produzir, como deve desincentivar quando não interessa ao coletivo, como deve penalizar até com a desapropriação, quando a propriedade não é utilizada como bem produtivo. A terra, a propriedade em geral, tem que produzir, quer dizer, ser de utilidade para todos, mesmo sendo propriedade pessoal ou particular.

Seria a posse um estado de fato ou de direito?

BONFANTE, Instituição de Direito Romano, par.112, pugna por esta tese: "a posse é um fato que a lei tolera como tolera também outros fatos mais graves, porque a lei civil não representa toda a ordem ética. Não é direito porque a todo o direito corresponde uma ação que o protege das ofensas e vai buscar a coisa no poder de quem quer que seja. O possuidor, entretanto, não tem ação quando a coisa se extravie. Se a posse fosse um direito real, como devia ser, teria que competir ao possuidor o direito de seqüela ou de seguir a coisa no poder de quem quer que a detenha.

No entanto a recuperação da coisa só é admissível contra o espoliador; é relativa, e não absoluta, como seria, se fora direito.

A posse havia de ser, como expressa BONFANTE, "tutelada por si mesmo etiamsi casu possessor amiserit possessionem, isto é, sem consideração à causa da perda."

Segundo, Octavio Moreira Guimarães, essa argumentação todavia, não procede

Toda ação, supõe estes elementos constitutivos: 1. O princípio de direito que confere a ação (fundamentum agendi, propositio major); 2. O fato que dá lugar à aplicação deste princípio.

O fundamento da ação possessória é o direito que decorre da posse; e que, ameaçado ou violado, movimenta-se na sua defesa, para sua restituição ao estado anterior.

Não é o conteúdo do direito que legitima sua existência. Há direitos de maior ou menor extensão, e com virtualidades diferentes. É licito, pois, afirmar que o ius possessionis, embora de conteúdo restrito, pode ser e é ainda assim um direito.

Quanto a proteção da posse, ensina, Francisco Eduardo Loureiro

"Diversas teorias, agrupadas em absolutas e relativas, procuram explicar a razão pela qual se protege a posse.

Como bem esquematizou Manuel Rodrigues, funda-se a proteção possessória em argumentos diversos, que assim podem ser resumidos: nas teorias absolutas protege-se a posse porque: é um ato de vontade do homem; constitui uma categoria econômica independente; nas teorias relativas protege-se a posse porque:é um meio de evitar a violência; é uma presunção de propriedade; é a defesa avançada da propriedade.

Entre as chamadas teorias absolutas, a posse é protegida por si mesma, como categoria juridicamente independente. A posse pode estar ou não de acordo com a lei, mas enquanto não se provar, pelos órgãos competentes, a ofensa a uma vontade universal, deve ser respeitado o fato decorrente da vontade individual. A mesma teoria, por outro ângulo, defende a proteção da posse na medida que esta constitui forma de apropriação das utilidades das coisas, que são aplicadas à satisfação humana
Já as teorias relativas não justificam a proteção possessória pelo instituto em si mesmo, mas sim como conseqüência de outras realidades econômico-sociais, ou necessidade de proteção a outras instituições. As teses são as mais variadas. Protege-se a posse como complemento necessário da proteção da propriedade. Pela necessidade de se evitar a violência, ou um atentado contra a ordem jurídica. Também porque ninguém pode juridicamente vencer a outrem, se não tem motivos preponderantes em que se funde sua prerrogativa"

Nesse sentido, a Lei 601, de 18 de setembro de 1.850, em seu artigo 5º, estabeleceu: "Serão legitimadas as posses mansas e pacíficas, adquiridas por ocupação primária ou havidas do primeiro ocupante, que se acharem cultivadas, ou com princípio de cultura e morada habitual do respectivo posseiro, guardadas as regras seguintes..."

Note-se que a primeira lei que regulamentou o direito de propriedade no Brasil, teve na posse dos bens imóveis o seu lastro de sustentação.

A posse pode ser classificada como:

Genérica:

É a resultante de obrigação ilícita (injusta) ou porque há uma relação contratual obstando esse juízo, como ocorrem respectivamente na posse do ladrão e do locatário.

Justa:

Se diferencia da posse genérica, porque não tem vício, nem é violenta ou clandestina. E diferencia da posse contratual ou legal, porque, embora mirem ambas a utilização econômica da coisa, é diferente a causa da detenção, numa desconhecendo o direito alheio e na outra como função negativa, isto é, há o reconhecimento do contrato ou da Lei.

Octávio Moreira Guimarães, esclarece que, para que a posse seja justa há de ser adquirida sem lesão ao direito alheio, tem que ser pública ou manifesta, para que terceiros interessados a conheçam e tenham dessa maneira possibilidade de se opor à sua continuação, deve ser contínua, e a descontinuidade se opera ou por efeito material, isto é, pela perda da posse quer por ato natural, quer por ato forçado (artigo 520 - I, II, II e IV do Cód.Civil).

Deve ainda ser essa posse incontestada para ser legítima, devendo o possuidor deter a coisa como própria, com animus domini.

Sem esse requisito a posse não produzirá os efeitos jurídicos que a lei confere à posse legítima ou justa.

Prescreve nossa Lei Civil ainda que, não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância, conforme disposto no artigo 497.

Exemplificando, Astolfo de Rezende, em sua obra, Manual Do Código Civil Brasileiro, p. 135, doutrina, "aquele que permite a outrem passar pelo seu terreno, tirar a água na sua fonte, ou gozar da sombra de suas árvores, entende-se que concede essas vantagens por mero favor; e, portanto, que se reservou o direito de retirar a sua permissão quando não julgue mais oportuno, mantê-la".

Posse de Boa fé:

A posse de boa fé, para ser assim considerada, além dos requisitos objetivos da posse justa, requer ainda um título translativo. É o que prescreve o Código Civil em seu artigo 490 "É de boa fé a posse, se o possuidor ignora o vício, ou obstáculo que lhe impede a aquisição da coisa ou do direito possuído".

A posse, pode ainda ser objeto de aquisição, conforme está contido no artigo 493, I, II e III, da Lei Civil.

Das formas de aquisição da posse, elencadas no artigo 494 da Lei Civil, a mais intrigante é a que decorre do "Constituto Possessório"

Trata-se de ato pelo qual o vendedor transmite a posse da coisa que vendeu, continuando porém, a detê-la em nome do comprador, por uma convenção que as partes estabeleceram. Dá-se, então, uma tradição fictícia. O alienante possuia a coisa em nome próprio e, após aliená-la, a possui em nome alheio. Através do constituto possessório é possível ainda perder a posse conforme se infere do artigos 620 e 621 do Código Civil.

As conclusões que chegamos através do estudo da posse, de forma alguma esgotam o tema. Este ensaio, teve a pretensão apenas de buscar o entendimento do direito possessório, como essência da relação entre o homem e a coisa; como poder de fato, que se contrapõe a propriedade, que é o poder de direito. A posse constitui a dominação sobre a coisa, é como já dito, um estado de fato, e através dela, pode-se adquirir ou perder a coisa, podendo, tal modo de proceder, dar-se de forma justa ou injusta, de boa ou má-fe.

A busca dessa dominação pelo homem, existe desde os primórdios da humanidade. E, apesar de toda conceituação e teorias positivadas, continua ela sendo uma situação fática, que o direito positivado persegue.


BIBLIOGRAFIA

1. GUIMARÃES, Octavio Moreira, Da Posse e Seus Efeitos, Edição Saraiva, SP, 1939.

2. FRANÇA, R.Limongi, A Posse no Código Civil (Noções Fundamentais), 1964.

3. FORSTER, Germano Rezende, Programa de Direito Agrário, 1996.

4. LOUREIRO, Francisco Eduardo, Juízo Possessório e Juízo Dominial, Boletim Eletrônico 207, IRIB/ANOREG, 12/06/2000.

5. NEGRÃO, Theotonio, Código Civil e legislação civil em vigor, 18ª ed. , 1999, Ed. Saraiva.

Fonte: Escritório Online


Enviar este artigo para um amigo                            Imprimir


Para solicitar o e-mail do autor deste artigo, escreva: editor@escritorioonline.com



© 1999-2012 Escritório Online. Direitos Reservados. Leis 9.609 e 9.610/98.


Publicidade