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Escritório Online :: Artigos » Direito Bancário


O terror fiscal e a quebra do sigilo bancário. Comentários sobre a Lei Complementar nº 105

23/11/2001
 
Higor Vinicius Nogueira Jorge



"Na primeira noite / Eles se aproximam / Colhem uma flor de nosso
jardim / E não dizemos nada. / Na segunda noite, já não se escondem /

Pisam as flores / Matam nosso cão / E não dizemos nada. / até que um dia

/ O mais frágil deles / Entra sozinho em nossa casa, / Rouba-nos a lua

e, / Conhecendo nosso medo, / Arranca-nos a voz da garganta. / E porque

não dissemos nada, / Já não podemos dizer nada"

Maiakowsky

No dia 11 de janeiro de 2001 foi publicada a Lei Complementar nº 105, esta lei dispõe sobre o sigilo das operações de instituições financeiras e faz parte do pacote de medidas do governo para impedir a sonegação e a elisão fiscal no país.

O aspecto mais polêmico desta norma pode ser visto através da análise do § 4º, do artigo 5º, e do artigo 6º desta lei. Estes dois artigos analisados juntos possibilitam (ao arrepio da lei) a quebra do sigilo bancário pelas autoridades e agentes fiscais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, sem que haja autorização do juiz.

A partir de um olhar superficial sobre esta questão pode-se vislumbrar que essa possibilidade de quebra do sigilo bancário poderia ser utilizada como instrumento de pressão e perseguição contra determinadas pessoas, entretanto, uma análise apurada demonstra que este artigo é mais maléfico ainda, tendo em vista que viola a Constituição Federal e a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

A quebra do sigilo bancário sem a autorização judicial viola:

1- o princípio do devido processo legal (due process of law), tendo em vista que a lei exige a autorização do Magistrado.

2- o inciso X do artigo 5º da Constituição Federal (são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação), porque viola a vida privada e a intimidade do cidadão.

3- o inciso XII do artigo 5º da Constituição Federal (é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal), pois os "dados financeiros" do cidadão são uma das espécies do gênero "dados" que a lei trata, de forma que uma das condições "sine qua non" para que as autoridades tomem conhecimento desses dados é a autorização judicial.

4- o artigo XII da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ninguém será sujeito às interferências na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tal interferência ou ataques), ora que este artigo, assim como o artigo 5º, inciso X, da Carta Magna, assegura a inviolabilidade da vida privada.

É importante saber que o sigilo bancário é uma garantia individual que só pode ser violada em casos graves e com a autorização judicial, sendo que em razão de ser uma garantia individual é uma cláusula pétrea e a necessidade de autorização judicial não pode ser abolida, mesmo que seja através de uma Emenda Constitucional, seguindo as disposições do artigo 60, § 4º, inciso IV da Lei Maior.

Como afirma CELSO BASTOS, "a quebra de sigilo bancário só é admitida quando baseada em razões fundamentadas, onde há o interesse público relevante, como o da investigação criminal ou instrução processual penal ou em virtude da excepcionalidade do motivo, desde que mediante a autorização judicial".

Outra questão que macula a lei em comento diz respeito as pessoas que não poderão sofrer a violação de seus sigilos. Conforme o §3º, do artigo 5º desta lei, as operações financeiras efetuadas pelas administrações direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não podem ser objeto de violações.

Este parágrafo é um verdadeiro contra-senso, pois viola os princípios da moralidade, legalidade e publicidade inerentes a Administração Pública (vide artigo 37 da Constituição).

Ao fazer estas críticas a lei, não estou defendendo que os sonegadores fiquem impunes, pois tenho consciência que a sonegação fiscal é um dos grandes culpados do déficit público e da conseqüente falta de recursos do Estado, mas entendo que a Constituição deve ser respeitada, pois não podemos nos sujeitar a este aumento gradativo de atentados contra Direitos e Garantias Individuais que parecem constituir um dos principais objetivos (além de transformar o Brasil em uma "província do capitalismo mundial", como bem afirmou OTAVIO IANNI) do presidente Fernando Henrique Cardoso.

Encerrando, acredito que o Supremo Tribunal Federal (STF), exercendo sua função de guardião da Constituição Federal, tem o dever de declarar a inconstitucionalidade desta lei (artigo 102, I, alínea a, da CF), pois as insistentes tentativas de lesar Direitos e Garantias Individuais têm causado uma instabilidade jurídica que só tende a causar transtornos no país, e nos faz lembrar do Ciclo do Terror, que precedeu a Queda da Bastilha na França. Só nos resta uma dúvida: se vivêssemos nesse período, quem deveria ser mandado para a guilhotina? Os governantes ou o povo que elegeu esses governantes?

Fonte: Escritório Online


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