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O processo criminal e a apelação - Possibilidade de diligências na fase recursal - Artigo 616 do Código de Processo Penal - Doutrina e Jurisprudência

02/02/2003
 
Eliane Alfradique



O artigo 616 do Código de Processo Penal, ora examinado estatui in verbis: “No julgamento das apelações poderá o tribunal, câmara ou turma proceder a novo interrogatório do acusado, reinquirir testemunhas ou determinar outras diligências”. E, ainda, o artigo 617 determina: “O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões aos disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença”.

O art. 616 do CPP nesse sentido se engasta ao contido no princípio da ampla defesa, art. 5º, LV, fazendo assim, parte dos preceitos fundamentais da Constituição da República de 1988. A regra do art. 616, do CPP, deve ser concebida na linha de visão do princípio da Ampla Defesa, de Dignidade Constitucional, devendo ser assegurado ao réu a faculdade de ser novamente interrogado, reinquirir testemunhas e requerer diligências, quando surja no espaço factual a possibilidade de que uma prova inovadora venha esclarecer e consolidar a busca da verdade real. Esta é a linha de pensamento dos operadores do Direito que têm mais que o poder-dever de julgar, mas o anseio de Justiça.

Analisemos o contido nos artigos 383, 386 e 387 do CPP. O art. 383 assim preceitua: “O juiz poderá dar ao fato definição jurídica diversa da que constar da queixa ou da denúncia, ainda que, em conseqüência, tenha de aplicar pena mais grave”. Deve haver uma correlação entre a sentença e o fato descrito na denúncia ou na queixa, ou seja, entre a imputação e o fato pelo qual o réu é condenado. Esse princípio da correlação entre o fato imputado e a sentença representa uma das mais relevantes garantias do direito de defesa e qualquer distorção, sem obediência aos dispositivos legais cabíveis, acarreta a nulidade da decisão. Não pode o juiz, assim, julgar o réu por fato de que não foi acusado (extra petita ou ultra petita) ou por fato mais grave (in pejus), proferindo decisão que se afaste do rogatório da acusação. O Tribunal de Justiça do Paraná já julgou que “O princípio da correlação entre a imputação e a sentença representa uma das maiores garantias do direito de defesa, que se acha tutelado por via constitucional” (RT-565/383). Permite o art. 616, que o Tribunal desclassifique a infração nos termos do art. 383 do CPP. É possível, assim, a emendatio libelli também em segundo grau. Embora, não se pode agravar a pena. Por exclusão, não permite o art. 617 que se aplique no julgamento o artigo 384, pois tal permissão redundaria na reabertura do procedimento instrutório.

A respeito, o STF dispôs em súmula nº 453 que: “Não se aplicam à segunda instância o art. 384 e parágrafo único do CPP, que possibilitem dar nova definição jurídica do fato delituoso, em virtude de circunstância elementar não contida explícita ou implicitamente na denúncia ou queixa”.

PROBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS:.
Embora a apelação permita o reexame da matéria decidida na sentença, o efeito devolutivo não é pleno, ou seja, não pode resultar do julgamento desfavorável à parte que interpôs o recurso. Recorrendo apenas o réu, não é possível haver reforma da sentença para agravar sua situação; recorrendo o Ministério Público em caráter limitado, não pode o Tribunal dar provimento agravando em maior extensão a situação do acusado. A proibição da reformatio in pejus torna também inadmissível que se acolha nulidade não argüida pela acusação, o que poderia prejudicar o recorrido. Estatui a súmula 160 do Pretório Excelso: “É nula a decisão do Tribunal que acolhe contra o réu nulidade não argüida no recurso da acusação, ressalvados os casos de recurso de ofício”. Também é vedada a reformatio in pejus indireta. Anulada uma decisão em face de recurso exclusivo da defesa, não é possível, em novo julgamento agravar a sua situação. Não há que se falar em reformatio in pejus na decisão mais gravosa para o réu se havendo apelado o Ministério Público, ficou prejudicado em seu recurso em razão de provimento daquele interposto pelo réu quanto à questão preliminar, isto porque, a sentença não transitou em julgado para a acusação e, se apreciado o seu apelo, a situação do acusado poderia ser agravada.

REFORMATIO IN MELLIUS:

De acordo com o princípio ne est judex ultra petita partium, não pode o Tribunal ad quem em recurso exclusivo da acusação, reformar a decisão em favor do réu, seja atenuando-lhe a pena, seja beneficiando-o de outra forma. É orientação do STF que não é possível a reformatio in mellius pois há coisa julgada para o réu, o que incide na hipótese o princípio tantum devolutum quantum appelattum. No entanto, grande parte da doutrina e a jurisprudência têm aceitado a reformatio in mellius. Dispondo o art. 617 que o tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 3 387 do CPP, no que for aplicável, não podendo porém ser agravada a pena, quando houver recurso da defesa. A jurisprudência tem sido firme no sentido de que “o tribunal pode julgar extra petita em favor do condenado, em recurso exclusivo da acusação. Neste sentido, lecionam Marques, José Frederico, Tourinho Filho, Fernando da Costa, RT, 490/327, 514/357, 528/326, 544/399, 556/348, 561/355, entre outras.

Feito este escorço introdutório, passemos à análise do art. 616 do CPP, que além de estar imbricado no art. 5º, LV da Constituição, (ampla defesa), também se liga ao princípio fundamental inserido no art. 5º, inciso LVII, que determina que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença condenatória”. É o princípio da presunção de inocência, que deve nortear a decisão de deferimento de diligências, reinquirição de testemunhas e interrogatório do acusado fulcrados no artigo 616 do CPP. A consagração do princípio da inocência na Carta Magna (art. 5º, LVII), norma programática e de interpretação, capaz de neutralizar presunções contrárias ao acusado e impor ao intérprete a fiel observância dos princípios do favor libertatis e do in dubio pro reo, este é o sentido do inciso LVII do art. citado. De conseguinte, o princípio da presunção de inocência impede se arguam presunções contrárias ao réu. O que se busca no processo criminal é a verdade real. É justo que os julgadores devem estar atentos a procrastinações e alicantinas, e tutelar por outro lado, com segurança, os direitos de defesa. O ensinamento de José Frederico Marques sintetiza a grandeza e a utilidade do art. 616 do CPP, quando ensina: “As diligências probatórias podem dizer respeito a quaisquer das fontes de convicção admitidas na instrução criminal. O essencial é que sejam necessárias ou úteis ao esclarecimento da verdade”. O fato indiscutível é que o referido artigo oferece uma variante, de grande relevância emblemática. Com a responsabilidade de formar o íntimo convencimento, mediante a livre apreciação da prova, no seu conjunto, tal qual o fez o juiz em primeira instância, os juízes que vão julgar o caso em segunda instância, têm naturalmente, a liberdade de fazer o exame direto dos elementos pessoais de prova, pelo que autoriza o art. 616 (novo interrogatório, reinquirição de testemunhas). Sem necessidade de termo, pois os julgadores estão presentes, e não há outra instância ordinária, para apreciar a questão. A iniciativa de qualquer dessas providências evidencia o animus imparcial e peculiar de nossos julgadores, pois tal atitude tem a marca da judicialidade e da observância dos ditames imperativos da ampla defesa e da presunção de inocência, elencados em nossa Lei Maior. Pode ser solicitada pelo Relator, Revisor ou outro juiz, que fizer parte da Câmara, ou turma.

Sady Gusmão salientou, como de muita importância, a disposição do art. 616 do CPP, “a qual faculta ao tribunal atividade ex officio em relação à prova, admitindo até novo interrogatório do réu”. Bem é de ver, não há necessidade de conversão de julgamento em diligência, desde que existam possibilidades de se acrescentar qualquer prova legítima que venha em socorro à verdade dos fatos, tal orientação deve ocorrer. A verificação da prova a ser produzida, como verbi gratia, de uma testemunha que vai esclarecer os fatos e dar razões sérias de conhecimento da questão posta em recurso, não pode nunca ser desprezada e deve fazer parte do rol de diligências a serem realizadas. Só existe o impedimento da reformatio in pejus, no recurso pelo réu interposto, vez que o art. 617 só não admite a agravação da pena. Neste sentido, porém, circunscreve Manzini a questão: “Pois que a proibição da reforma para pior, em relação às sanções, diz respeito às penas”. Anota com acerto Júlio Fabrini Mirabete, que “a conversão em diligência, pode também ser resultado de requerimento ou sugestão do Ministério Público de 2ª Instância. Entendo correta a colocação, pois sendo o membro do Parquet, neste caso, parte, dominus litis da ação penal, nada mais jurídico que seu requerimento para a promoção da justiça. Assim como, nessa mesma linha de raciocínio, o acusado, como parte, e interessado na obtenção e esclarecimento da verdade, creio ser parte legítima para requerer ou sugerir, nos moldes do Ministério Público. Embora não seja explícita a norma do art. 616 do CPP, quanto à possibilidade de o Ministério Público e o acusado requererem tais medidas, mas tais assertivas dessumem de toda uma estrutura legal, onde no ápice, está vigilante a Constituição da República que consolidou direitos fundamentais como o da ampla defesa e da presunção de inocência, que cabem na regra antiga, mas atual, do artigo 616.

O país vem de atravessar um de seus períodos mais críticos, e, ao que parece, a nação inteira já se acostumou com aqueles comportamentos políticos que, de certa forma, abriram fissuras no nosso mundo jurídico-político, e, agora, quando surge um texto de envergadura de uma Constituição liberal enfatizando os direitos e garantias fundamentais do homem, sente-se uma certa dificuldade em fazer penetrar naquelas fendas esse gesto de ternura, de amor, de humanidade, de compreensão, de respeito à dignidade humana. Mas, estamos no caminho certo. A Jurisprudência farta dos Tribunais Superiores, vem de encontro à utilidade e eficiência do art. 616 do CPP. Nesse sentido:

Constitucional, processual penal, Princípio da Ampla Defesa, Diligências em sede recursal, CPP, art. 616- “Hábeas Corpus”.
A regra do art. 616, do CPP, deve ser concebida na linha de visão do Princípio da Ampla Defesa, de Dignidade Constitucional, devendo ser assegurado ao réu a faculdade de ser novamente interrogado e Requerer Diligências. Hábeas Corpus Concedido. ( STJ, Hábeas Corpus 6239- Ministro Vicente Leal- Sexta Turma).

EMENTA: Direito Constitucional e Processual Penal. Prova testemunhal. Diligências “ex officio”. Princípios da ampla defesa e do contraditório. Nulidades. “Hábeas Corpus”.
A aplicação do art. 616 do CPP se nos afigura a norma reguladora para novas diligências e inquirição de testemunhas, para esclarecimento da verdade, tudo em nome do princípio da ampla defesa. (Habeas Corpus 70.882/SP- Ministro Sydney Sanches).

RECURSO- DILIGÊNCIA. Ao Órgão revisor é assegurada a possibilidade de levar a efeito novo interrogatório do acusado, a reinquirição de testemunhas e determinar outras diligências-art. 616 do Código de Processo Penal. Tal procedimento é norteado pela busca da verdade real, não se podendo cogitar de limitação consideradas as balizas do recurso interposto. (HC-69335/SP, Ministro Marco Aurélio-2ª Turma-STF).

Habeas Corpus-Recurso de Apelação. Diligências. Excesso de Prazo. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.
1- Se é seguro que a celeridade do processo deve ser almejada em obséquio, sobretudo, da liberdade, principalmente em existindo custódia decretada, nem por isso há falar em irrazoabilidade da demora, ante a busca do conhecimento real dos fatos.
2- O prazo para a realização de diligências, a fim de instruir o processo, não tem a característica da fatalidade, fazendo-se imprescindível considerar o juízo da razoabilidade para definir o excesso, quanto mais nas hipóteses em que as diligências foram requeridas pela defesa. (Habeas Corpus 13.702 – Ministro Hamilton Carvalhido – Sexta Turma do STJ).

Responsabilidade Criminal – Conversão de Julgamento em Diligências em Segunda Instância. Não Cabimento –
1- É defeso, ao Tribunal de segunda instância, converter o julgamento em diligências, na hipótese de interposição de recurso exclusivamente pela defesa, sob pena de imprópria reabertura de fase instrutória do processo e diante de incontestável dúvida sobre eventual prejuízo que pode advir ao réu. (Habeas Corpus 49073/PR, Ministro Gilson Dipp da 5ª Turma do STJ).

Torrenciais julgados de nossos Tribunais mantém como fonte reguladora da possibilidade de diligências, interrogatório e reinquirição de testemunhas, o art. 616 do CPP, sempre com o objetivo de tutelar direitos assegurados de forma ampla pela Constituição da República, aos acusados, obedientes ao princípio máximo da ampla defesa e da presunção de inocência, axiomas que estão consagrados pelo Estado de Direito. O Supremo Tribunal Federal, em sintonia com a exegese do citado artigo, vêm decidindo como o fez o Ministro Luis Gallotti no HC 35270 – 1ª Turma, ao decidir: “Apelação Criminal. Possibilidade de novo interrogatório, reinquirição de testemunhas e outras diligências. Artigo 616 do Código de Processo Penal. Trata-se de faculdade conferida aos Tribunais”.

Uma questão merece um exame mais detalhado, a final, é o que se propõe com este tema. O ponto a ser estudado diz respeito à possibilidade de o acusado requerer à Câmara ou Turma, as providências contidas no art. 616 do Código de Processo Penal. É fato que a apelação devolve à instância superior a incumbência de reexaminar todo o processo e de proferir nova decisão. Esta é inteiramente independente da decisão de primeira instância, que passa a ser um simples episódio histórico dentro do processo.

O Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em seu art. 79, prevê que “O Órgão Julgador poderá, em qualquer caso, converter o julgamento em diligência, para correção de vício sanável, suprimento de omissão ou melhor esclarecimento da espécie”. E mais, diz o art. 88 do RI que “Da decisão que converter o julgamento em diligência (art.79) não haverá acórdão. O Secretário, após transcrevê-la nos autos, os fará conclusos ao relator, que, por despacho, nas 48h (quarenta e oito horas) seguintes, providenciará a diligência, concedendo prazo razoável para ser efetuada”. Diz o parágrafo 1º que “A diligência poderá ser processada perante o relator ou, por determinação deste, mediante baixa dos autos a juízo de primeiro grau, caso em que o relator, se a lei não o estabelecer, marcará, para restituição dos autos, prazo que será anotado pela Secretaria. Esgotado o prazo, ou a prorrogação que houver deferido, o relator providenciará para que os autos sejam restituídos com a maior urgência possível”. Nenhuma dúvida quanto ao respaldo legal conferido pela Lei Federal, no art. 616 do CPP, e também pelo Regimento Interno dos Tribunais, que tutelam as proposições contidas no art. 616.

O que se quer demonstrar neste trabalho é a possibilidade de o acusado ou o Ministério Público poder requerer as medidas encerradas no citado artigo da lei processual penal. Cremos, que essa razoabilidade de pretensão do Ministério Público ou do acusado, encontram seus parâmetros positivos ante os textos claros da Constituição da República. Iniciando a dedução de razões, deve ser citado o contido no art. 5º, LV, da CF: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Fundamentais todos os direitos abrangidos pelo artigo 5º, de nossa Carta Magna, democráticos também. Quando a lei maior diz que “são assegurados o contraditório e a ampla defesa”, fecham-se as portas do arbítrio, da onipotência do Estado, para dar vez à dignidade humana, tão admoestada pelos vilões da lei. A Constituição fala em ampla defesa, que quer significar defesa sem restrições, ilimitada e de grandes dimensões e não qualquer defesa, fazendo parte desta, não só a defesa técnica, com todos os meios e garantias para que qualquer acusado possa requerer suas provas, sejam quais forem, e isso ser tutelado efetivamente pelo Estado, no exercício de seu poder punitivo.

Tenho esta, como a maior razão para o réu ou o Ministério Público, ambos, partes na ação penal, terem o direito de requerer diligências, reinquirição de testemunhas e novo interrogatório na sede recursal, em conformidade com o art. 616 do CPP.
Da mesma forma, quando se trata de processos de competência do Tribunal do Júri, encontramos no inciso XXXVIII, do art. 5º, letra “a”, o asseguramento da plenitude de defesa, o que corresponde à máxima extensão de defesa, a absoluta e inteira defesa, para garantir, ao final a Justiça, anseio de felicidade, na lição de Kant.

A par dessa principal razão de ser, para requerimento de tais faculdades, encontramos no mesmo art. 5º, LVII, da CF, o axioma da presunção de inocência. Este princípio da presunção de inocência é um fracionamento do princípio do devido processo legal, sendo este a viga mestra onde se imbricam os demais princípios. Todos esses preceitos, embrionariamente se prendem ao devido processo legal. Porque, se de um lado, encontramos o jus puniendi do Estado, que é o seu titular, de outro, sobressai, não com menor pujança, mas em igualdade de amparo e efetividade, o jus libertatis do cidadão, reputado como o maior de todos os bens jurídicos afetos à pessoa humana. Vindo no bojo da Revolução Francesa, esse postulado, que está no contexto do Princípio do Devido Processo Legal, assim se vê expressado na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1791, assim preceituado: “Tout homme étant presume innocent jusqu’a ce qu’il ait été éclaré coupable; s’il est jugé indispensable de l’arrêter, toute rigueur qui ne serait nécessaire pour s’assurer de as personne, doit être sévérement reprimée par la loi”. Na Declaração dos Direitos Humanos, da Organização das Nações Unidas, de 1948, proclamou no artigo 11: “Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não se prova sua culpabilidade, de acordo com a lei e em processo público no qual se assegurem todas as garantias necessárias para sua defesa”. Entretanto, RUI BARBOSA, advertiu: “Não sigais os que argumentam com o grave das acusações, para se armarem de suspeita e execração contra os acusados. Como se, pelo contrário, quanto mais odiosa a acusação, não houvesse o juiz de se precaver mais contra os acusadores, e menos perder de vista a presunção de inocência, comum a todos os réus, enquanto não liquidada a prova e reconhecido o delito”. De todas as definições, a mais própria ao sentido subjetivo, que cada um tem como sua verdade, entendo que o pronunciamento da Suprema Corte dos Estados Unidos dá melhor entendimento a esse axioma do devido processo legal: “O conceito do devido processo abraçado em nossa constituição remonta diretamente, há 600 anos atrás. É mais do que um conceito técnico legal, pois ele permeia nossa Constituição, nossas leis, nosso sistema, e nosso próprio modo de vida ___ que a toda pessoa deverá ser concedido o que é devido”. E, assim proclama a nossa Constituição: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”.
A faculdade concedida às partes, Ministério Público e acusado, de poder requerer diligências, reinquirição de testemunhas e novo interrogatório, vem sintonizada com outro princípio de grande relevância no Processo Criminal, que é o da verdade real. Na lição de Mirabete, José Fabrini, “Com o princípio da verdade real se procura estabelecer que o jus puniendi somente seja exercido contra aquele que praticou a infração penal e nos exatos limites de sua culpa numa investigação que não encontra limites na forma ou na iniciativa das partes. Decorre desse princípio o dever do juiz de dar seguimento à relação processual quando da inércia da parte e mesmo de determinar, ex officio, provas necessárias à instrução do processo, a fim de que possa, tanto quanto possível, descobrir a verdade dos fatos objetos da ação penal”.

Tal como sublinhado pelo Min. Luiz Vicente Cernicchiaro em acórdão relatado no Superior Tribunal de Justiça, “O processo penal é complexo de relações jurídicas que tem por objeto a aplicação da lei penal. Não há partes, promotor ou lide, nos termos empregados no processo civil. Juridicamente, acusação e defesa conjugam esforços para decorrência do contraditório e defesa ampla, buscando esclarecimento da verdade real. Ninguém pode ser condenado sem o devido processo legal”.
E, em sendo assim, especial relevância atribuiu a Constituição aos princípios informativos do processo criminal, a tal ponto, que inquestionável se torna a prática de o acusado e o membro do Parquet, como legítimos interessados na apuração da verdade real, ter a oportunidade de requerimento junto à Câmara, Relator e Revisor, de diligências, reinquirição de testemunhas e novo interrogatório e mais que for necessário à plena defesa e sua real efetividade.Tal legitimidade processual não implica contradição a nenhuma norma moral, antes e primordialmente é conseqüência dos democráticos princípios insculpidos na Carta de 1988. O direito à prova é missão das partes envolvidas e na definição de Mittermayer, “a prova é o complexo de motivos produtores da certeza”. Lembrando que nenhum princípio é absoluto em direito e relembrando da “lógica do razoável” do mestre Recaséns Siches, poderão ocorrer situações onde estarão na disputa dois princípios protetores de bens jurídicos. Deve-se procurar, então, o chamado “ponto de equilíbrio”.

De forma conclusiva e técnica, deve ser ressaltado, que todos os Princípios que norteiam o Processo Criminal, são abrangentes e fazem parte dos direitos e garantias individuais, elencados no art. 5º da Constituição da República. E, apenas para relembrar, tais direitos e garantias são cláusulas pétreas, e como tais, de acordo com o artigo 60, parágrafo 4º da CF, “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir”. IV-os direitos e garantias individuais.

Em obediência a esses princípios, surgindo a necessidade de uma prova para esclarecer a verdade, para que haja uma prestação jurisdicional justa e gizada nas vigas mestras da dignidade humana, deve ser admitidos o requerimento das partes, Ministério Público e acusado, no sentido da realização de diligências, reinquirição de testemunhas, ou oitiva de testemunha que venha efetivamente esclarecer o caso, finalizando por simbolizar o grande anseio de justiça, que é, indubitavelmente, a verdade real. É enfim, o que mais se ajusta aos nossos princípios e com o Estado de Direito. Entendo não haver óbice ao acolhimento dessas medidas pelo acusado e pelo Ministério Público ante à necessidade de completar o ciclo total do direito de defesa, garantido pela Lei Maior. É verdade que fica adstrito ao arbítrio do julgador, que analisará o pedido e deferirá a medida que contiver realmente possibilidade de inovar, ou seja, produzir prova inovadora, que modifique o contexto das provas já realizadas. Deve ser a busca incessante, também, dos juízes.

O juiz exerce o poder de julgar e as funções inerentes à atividade jurisdicional. Certo é que a lei processual autoriza o juiz a, ex officio, investigar a verdade. Porém, subsidiariamente, como se observa no art. 156 do Código Penal Brasileiro.
O processo criminal norteia-se pela busca da verdade real, alicerçada em regras como a do referido artigo, que retira o juiz da posição de expectador inerte da produção de prova para conferir-lhe o ônus de determinar diligências, ex officio, sempre que necessário para esclarecer ponto relevante do processo, esclarece Damásio de Jesus.
A respeito do tema, com propriedade ensina Carnelutti: “As provas servem, exatamente, para voltar atrás, ou seja, para fazer, ou melhor, para reconstruir a história”. “Como faz quem, tendo caminhado através dos campos, tem que percorrer em retrocesso o mesmo caminho? Segue os rastros de sua passagem....o risco de errar o caminho....”. “...e tanto é mais notório quando o passado se reconstrói para se decidir o destino de um homem”.
Para realce da matéria comentada, as lições do mestre Tornaghi são elucidativas: “Prova penal é uma reconstrução histórica; o procedimento de prova é realmente uma reconstituição do fato criminoso; todo o processo está penetrado da prova, embebido nela, saturado nela. Sem ela, ele não chega a seu objetivo que é a sentença. Por isso a prova foi chamada ”alma do processo” (Mascardo), certo que o processo é atividade empírica, nem sempre compatível com a lógica formal e abstrata; a realidade não tem lógica. Mas ai entra a sabedoria do juiz, aquilo que os romanos chamavam prudentia. Provar, no processo penal, significa fazer conhecer a outros uma verdade material conhecida por nós. É a reunião dos meios aptos a convencer o espírito de quem julga.

A busca da verdade real ou material, doutrina Afrânio Silva Jardim, consagrada na segunda parte do art. 156 do Código de Processo Penal é uma decorrência da própria natureza do bem da vida e valores que justificam a existência mesmo do processo penal: o interesse do Estado em tutelar a liberdade individual”.
Alinhadas essas observações de grande relevância para o processo criminal e sua concludente decisão, desde que observada a defesa ampla e o uso de todos os recursos e meios a ela inerentes, firma-se definitivamente não implicando contradição aos princípios norteadores do processo criminal, o direito de o Ministério Público e acusado se valerem da norma processual do artigo 616 do Código de Processo Penal para buscar esclarecimentos, porventura, necessários à consolidação da verdade real. Finalizando, vale citar Ementa do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, da lavra da Des. Relatora Aparecida Fernandes, quando no julgamento da apelação criminal nº 134684, decidiu que “Havendo necessidade de maiores informações probatórias para julgar a apelação, há que aplicar o art. 616 do Código de Processo Penal”. “Sessão suspensa para que se proceda às diligências necessárias”.


BIBLIOGRAFIA:
a- MARQUES, José Frederico in Tratado de Direito processual Penal, Saraiva, vol. 3, p. 165.
b- GUSMÃO, Sady, in Breves Anotações, p. 195.
c- TOURINHO, Fernando da Costa in O Processo Penal, Saraiva, vol. III, p. 456.
d- MIRABETE, Júlio Fabrini, in O Processo Penal e Código de Processo Penal Interpretado, Atlas, p. 714 e p. 44.
e- BARBOSA, Rui, in O Dever do Advogado, Fundação Casa de Rui Barbosa, Aidê Editora, 1985.
f- TORNAGHI, Hélio, Elementos do Processo Penal, Saraiva, vol. I, págs. 271,311. CARNELUTTI, Francesco, As Misérias do Processo Penal, Editora Conan, p.50,59.
g- DAMÁSIO E. de Jesus, Código de Processo Penal Anotado, Saraiva, p.499.
h- JARDIM, Afrânio Silva, Ação Penal Pública, Forense, pág. 103/105.
i- MITTERMAYER, C.J.A. in Tratado da Prova em Matéria Criminal, Bookseller, 1996, p.75.
j- Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.(citações no texto)
k- Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. (citações no texto)
l- Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. (citações no texto)
m- Súmulas do Supremo Tribunal Federal nºs 453 e 160.
n- Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Fonte: Escritório Online


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