:: Seu mega portal jurídico :: inicial | sobre o site | anuncie neste site | privacidade | fale conosco
        

  Canais
  Artigos
  Petições
  Notícias
Boletins informativos
Indique o
Escritório Online
 

Escritório Online :: Artigos » Direito Civil


A mediação no Direito de Família

27/06/2003
 
Enéas Castilho Chiarini Júnior



É público e notório que o Sistema Judicial (entendendo-se a palavra “sistema” como empregada na sua acepção física, significando os Fóruns, Tribunais, e demais "membros" componentes deste sistema) está sobrecarregado de trabalho e que suas decisões, por isso, (e outros motivos, tais como a necessidade da ampla defesa processual, aliada as atuais normas processuais, que propiciam a possibilidade à parte interessada de protelar a decisão judicial por até mesmo anos e anos) levam muito tempo para serem proferidas. Diante deste quadro concreto, urge que aqueles que trabalham com o direito busquem uma forma alternativa mais veloz, e que ainda assim mantenha a credibilidade, e, sobretudo, a imparcialidade de que goza o Poder Judiciário.

Neste período de globalização, onde constantemente ocorrem mudanças significativas no mundo real, é igualmente necessário que o Direito consiga sofrer pequenas "mutações", sem nunca deixar de lado sua finalidade principal, qual seja de garantir a segurança jurídica, que visa atingir a paz social.

Diante disto tudo, ressurge a mediação. Processo informal, imparcial, e sobretudo veloz, e ainda, de baixos custos, que consegue, por isso, manter a segurança jurídica.

Mas a maior qualidade da mediação, não é nenhuma destas citadas, e sim, a maior segurança com relação ao cumprimento dos acordos, uma vez que estes não são impostos "goela a baixo" das partes. Muito pelo contrário, as próprias partes sentem a necessidade de compor um acordo, e desta forma, empregam suas forças para persuadir a parte contrária de suas razões, o que faz com que uma parte entenda a posição da outra, e desta forma, cheguem à um consenso, onde nenhuma das duas partes saem "prejudicadas". Ambas as partes perdem, mas apenas perdem o mínimo necessário para a realização do acordo, fazendo com que no final ambas as partes ganhem.

Apesar de parecer contraditório, é necessário que ambos percam para que ambos possam igualmente ganhar. Um exemplo claro é dado pela máxima popular, segundo a qual "É melhor receber, ainda que pouco a pouco, que não receber nada". É isso que a mediação tenta colocar para as partes, que elas não necessitam ser adversárias, muito pelo contrário, elas podem ser aliadas, buscando uma solução que possa satisfazer o credor, e ao mesmo tempo que não penalize excessivamente o devedor, para que assim amos possam sair vitoriosos. O credor recebe sua dívida, ainda que com descontos e/ou parcelada, e o devedor fica "livre" da dívida que perseguia sua pessoa, maculando sua imagem perante a sociedade.

A mediação no processo de divórcio apresenta uma papel extremamente importante, pois tenta realizar um acordo que, muito provavelmente, somente ela seria capaz de conseguir. Um acordo que consiga sensibilizar ambas as partes de que a "guerra" não leva à lugar nenhum, e que somente um acordo pode possibilitar uma vida posterior mais tranqüila, principalmente se deste casamento que se acaba vieram a existir os filhos, que são os maiores prejudicados pelas brigas intermináveis à que está sujeito um processo de divórcio.

O processo de mediação aplicado aos casos de divórcio possui uma peculiaridade com relação aos outros processos judiciais, os quais também estão igualmente sujeitos à mediação. É justamente o aspecto psicológico das partes, seu desgaste mental, gerado pelo processo, que, pela sua peculiaridade, é capaz de trazer à tona os maiores erros cometidos por ambas as partes durante o período em que estes viveram juntos. Como se não bastasse a angústia em que as partes se encontram, esperando se ver livres do processo de uma vez por todas, através de uma solução que ponha um fim definitivo ao casamento, ainda estão sujeitas à possibilidade de verem suas vidas íntimas expostas da maneira mais desagradável possível.

Ainda que atualmente, seja freqüente outras formas de união, que não o casamento, muitas pessoas ainda procuram esta forma de união, quer seja por pressão familiar ou religiosa, ou mesmo por convicção pessoal. Quem deseja se casar, normalmente, não pensa na possibilidade da futura separação, acreditando que "isso não acontecerá comigo", ou "só acontece com os outros".

Justamente por essa peculiaridade do processo de divórcio, foi proposta por Águida Arruda Barbosa a expressão "Clínica do Direito", que significa, segundo a própria autora "...um modo não convencional de exercer a advocacia especializada em Direito de Família, buscando, na Mediação, o fundamento filosófico e metodológico desta atuação."

No início do casamento, conforme Bertoldo Mateus de Oliveira Filho, "...prevalece sempre um maior grau de tolerância, de compreensão e, mesmo, de renúncia, onde um quer parecer para o outro o complemento indicado, a peça faltante para o exato funcionamento da engrenagem afetiva..." Porém, mais tarde, "O surgimento das primeiras crises, que resultam do exaurimento desta etapa de sensibilidade romanesca, conduz ao questionamento profundo da relação, quando então se cogita de mudanças no curso da convivência [...] Se persistir, no entanto, o inconformismo pela falta de adequação do sonho à realidade, sem o rompimento da união, serão inevitáveis as frustrações e mágoas sentidas e represadas pela constatação de se viver numa situação indesejada e distante de tudo que fora previamente idealizado [...] a desconformidade entre realidade e fantasia pode se tornar tão insuportável, a decepção ser de tal sorte que nenhum se disponha a permanecer, preferindo buscar em novas tentativas o modelo imaginário de companhia." E, dessa forma, durante o casamento, alguma coisa acontece, que não estava nos planos do casal, surgindo assim, a necessidade da separação, quebrando-se assim a sagrada regra de "até que a morte os separe".

Com isso, aqueles que se vêm diante de um processo de separação começam a sofrer censuras de todos os lados, da família, da sociedade, da religião, dos filhos, e até de si mesmos. Por isso, as pessoas que estão envolvidas no processo de divórcio, se vêm em meio a uma avalanche de sentimentos, que podem influenciar decisivamente na negociação final. Existe uma tendência de se procurar acelerar ao máximo o processo, visando aliviar a ansiedade gerada pelo processo em si, que traz consigo o risco de se obter um resultado precário.

E, se, conforme Florence Kaslow, citado por Águida Arruda Barbosa, "...o caminho desejado for o litígio, então os cônjuges têm muitas probabilidades de se sentirem desamparados, pessimistas, abandonados e deprimidos, pois as negociações estão principalmente nas mãos dos advogados e as decisões relacionadas à custódia, às responsabilidades paternas e à divisão de bens ficam a critério do juiz. Há uma grande quantidade de ansiedade proveniente da incerteza. Dada a mistura de confusão, solidão, tristeza e luto por todas as perdas que a ruptura do casamento e da família trazem consigo, a retribuição pode se tornar um objeto dominante."

Para Águida Arruda Barbosa, neste contexto "...a primeira consulta ao advogado é de importância fundamental para o desenvolvimento da causa, ocasião em que deve ser instalada uma relação de confiança mútua, indispensável ao exercício da advocacia..." neste primeiro contato com o cliente, deve o advogado "...prestar as informações indispensáveis, para o momento: procedimentos judiciais e extrajudiciais a serem enfrentados. O objetivo desta pauta tem natureza organizadora, com propósito de ajuda à pessoa em sofrimento, para que ela não se iluda com expectativas irreais e fantasiosas em relação ao efetivo e possível papel do Judiciário. Essas informações sintéticas conterão a ansiedade do cliente em relação à demora do andamento do processo, mostrando a realidade concernente às sérias dificuldades e entraves da justiça."

Águida Arruda Barbosa, citando Françoise Dolto sintetiza: "...a única verdadeira razão de um divórcio é que um dos cônjuges não vê outra solução, senão esta, para dar continuidade a uma vida saudável" e, por isso, segundo Maria de Nazareth Serpa, "...Quem inicia um divórcio ou acredita que esteja sendo o pivot do sofrimento do outro cônjuge e dos filhos costuma experimentar um doloroso sentimento de culpa. Na tentativa de minimizar esse sentimento supervaloriza e tenta compensar o sofrimento da outra parte exagerando sua oferta durante a negociação. A depressão é também uma presença comum no processo e produz um efeito devastador no divórcio propriamente dito...". E, o Direito, de certa forma, ajuda a agravar a situação, quando toma como culpado pela separação o cônjuge que tem a iniciativa de pedir o divórcio, caindo esta presunção somente se este cônjuge comprovar cabalmente que a culpa pela separação pertence ao outro cônjuge.

Porém, muitas vezes, não existe culpa exclusiva de uma única parte. Ambos são culpados, além de que, segundo Jean Carbonnier, citado por Águida Arruda Barbosa, "ao menos um casal a cada grupo de três ou quatro se dissolve para que os outros se conscientizem do relativo sucesso de seus casamentos, da fragilidade deste sucesso, e do sentimento de precariedade, reforçando a coesão. De sorte que o casal divorciando pode ser sacrificado pela felicidade dos casais não-divorciandos. Trata-se de uma forma de higiene da sociedade".

O profissional mediador deve mostrar a ambos os cônjuges que a separação não deve ser utilizada como forma de punir, castigar, ou de se vingar da outra parte, principalmente se, desta união que se desfaz existir filhos em comum. Ele deve convencer as partes que, mesmo que o filho seja muito pequeno para entender o que está acontecendo, um dia ele irá crescer, e tomará consciência do que aconteceu durante o processo, e que, assim, pode ficar sabendo da desagradável situação que pode acontecer, onde um cônjuge acusa o outro de atos desonrosos, ou de palavras infames que podem ser ditas em relação à outra parte durante a separação.

As partes devem estar convictas de que o que quer que tenha acontecido para causar a separação, é um fato passado, e que o passado não volta jamais. Não mais importa, se este ou aquele cônjuge agiu de forma pouco moral para com relação ao outro, e sim, que a partir deste momento, ambos começarão uma nova vida, separados.

É necessário ainda, que, aquele quem faz a mediação do processo de separação, procure devolver a esperança às partes, mostrar que a vida não termina com o casamento. Deve ele, mostrar que, como bem lembra Bertoldo Mateus de Oliveira Filho, "...recomposta a vida diária a partir da retomada das atividades habituais, há de se cogitar da afirmação de novos laços com outras pessoas. Muitos, em verdade, se acostumam com a rotina individual surgida da condição de descasado e se postam precavidos a posteriores experiências de união..."

Assim, a mediação em família tem como objetivo a pacificação do conflito familiar, e vem a ser a atividade que tem por finalidade despertar a responsabilidade das partes e dos operadores do direito na reorganização familiar, valendo-se de todas as alternativas disponíveis para reconstruir um novo significado para a ruptura do casamento.

Para alcançar este objetivo, a mediação deve ser entendida como, nas palavras do Código Francês da Mediação, trazido por Águida Arruda Barbosa, "...um procedimento facultativo que requer a concordância livre e expressa das partes concernentes, de se enganjarem numa ação (mediação), com a ajuda de um terceiro, independente e neutro (mediador), especialmente formado para esta arte. A mediação não pode ser imposta. Ela é aceita, decidida e realizada pelo conjunto dos protagonistas".

O profissional deve, neste sentido, uma vez aceita a mediação, propor uma análise e interpretação dos fatos em si, que por si só, já é objeto de psicoterapia, oferecendo oportunidades para que os cônjuges localizem o nascedouro da ruptura da conjugalidade, cabendo refletir se esse casal está se divorciando por si mesmos, ou se são os não-divorciandos que os estão "pressionando", para, assim, poderem reafirmar seus casamentos. E, nos dizeres de Águida Arruda Barbosa, "...Embora essa análise refuja ao exercício da advocacia, pois seus resultados não teriam o condão de exercer influência imediata sobre a decisão do cliente, o conhecimento dessa via, por onde se extravasa a estabilidade do casamento, pode ser uma importante fonte de informação para que o operador do direito possa acentuar a sua sensibilidade no aprimoramento de uma escuta qualificada. E, quem sabe, até salvar um casamento!".

Não se deve chegar ao extremo, como fez Águida Arruda Barbosa, de considerar que "...o juiz está autorizado e obrigado a oferecer esta instância de mediação sob pena de ferir princípio que tipifica a omissão de socorro".

Por outro lado, porém, certamente, o juiz tem um papel fundamental na sociedade moderna, e a ele cabe, sem sombra de dúvidas, o dever moral de procurar, ao máximo, estimular a possibilidade de um acordo entre, não só os cônjuges que estão se separando, mas, entre as partes de toda e qualquer espécie de litígio que se fundamente em relação patrimonial disponível.

Também não é correto o legislador elaborar leis que prevejam a mediação obrigatória, pois esta, insista-se, é uma prerrogativa da parte, que deve aceitá-la de livre e espontânea vontade, sob pena de ser totalmente frustada. Aliás, diga-se, é absolutamente irrelevante o fato de estarem procurando um modo de legislar sobre a mediação, pois esta já está prevista no artigo 125, inciso IV, do C.P.C., que ordena ao juiz "tentar, a qualquer tempo, conciliar as partes", e, ainda mais especificamente, no artigo 331 do Código de Processo Civil, que diz: "Se [...] a causa versar sobre direitos disponíveis, o juiz designará audiência de conciliação...". Ao dizer "designará", a lei exprime um dever ao magistrado, não uma simples faculdade, e como à ele cabe o poder/dever de comandar a audiência (artigo 125 do C.P.C.) à ele cabe, também, e, portanto, o papel de mediador.

Faz-se necessário, desta forma, um profissional altamente qualificado para mediar o processo de divórcio. Um profissional que saiba ouvir os desabafos de ambas as partes em determinadas horas; um profissional que seja capaz de explicar às partes as vantagens que o acordo pode trazer para ambos; um profissional que, de preferência, entenda, ao menos um pouco, de psicologia para que possa compreender o que as partes somente dizem através dos atos, e que igualmente entenda de direito, para que possa, com seu conhecimento, convencer ainda mais rapidamente as inúmeras vantagens do acordo, além de poder orientar corretamente ambas as partes daquilo que a lei exige com relação aos deveres, e daquilo que ela oferece com relação aos direitos.

O ideal, seria uma "junta de mediação", composta por psicólogo(s) e advogado(s). Porém, esta é uma solução que ainda está muito distante da realidade de nosso país. Um país onde a grande maioria das pessoas não têm dinheiro, nem mesmo para sobreviverem dignamente, que dirá de dinheiro suficiente para arcar com as despesas de uma mediação deste nível. A solução seria criar "juntas" mantidas pelo governo, o que também não é viável frente às inúmeras e elevadíssimas dívidas que assombram todas as esferas do governo.

Um bom mediador deve procurar: 1) reconhecer o desconforto de seus clientes e se esforçar para deixá-los à vontade; 2) encorajar o cliente a discutir questões pessoais através do desenvolvimento do sentimento de confiança; 3) evitar agir julgamentalmente, evitando a moralização; 4) escutar ativamente os clientes, para encorajar a vazão de comentários por parte destes; 5) evitar fazer perguntas específicas para que não ocorram canalizações de comentários dos clientes; 6) evitar diagnósticos prematuros; 7) reconhecer seus próprios sistemas de valores, seus próprios preconceitos, e se esforçar para controlá-los; 8) compreender as limitações das palavras, e aprender a ler comunicações não-verbais, como expressões faciais e linguagem corporal; 9) reconhecer que estes clientes são altamente sugestionáveis, ansiosos por agradar e preparados para oferecer o que eles acreditam seja procurado pelos profissionais.

É necessário ainda, que, aquele quem faz a mediação do processo de separação, procure devolver a esperança às partes, mostrar que a vida não termina com o casamento. Deve ele, mostrar que, como bem lembra Bertoldo Mateus de Oliveira Filho, "...recomposta a vida diária a partir da retomada das atividades habituais, há de se cogitar da afirmação de novos laços com outras pessoas. Muitos, em verdade, se acostumam com a rotina individual surgida da condição de descasado e se postam precavidos a posteriores experiências de união..."

Deve-se ainda, alertar-se as partes para que, em caso de terem filhos, assim como sempre adverte Valter José Vieira (Juiz Titular da 2ª Vara Cível da Comarca de Pouso Alegre/MG) em suas audiências, "o que está terminando é o casamento, não a paternidade, ou a maternidade. Madrasta não substitui mãe, nem padrasto substitui pai." É necessário que ambos cuidem dos filhos, dividindo as alegrias e as preocupações. Um não deve usar o filho como meio de atacar o outro, pois assim estarão empurrando estas crianças para as ruas, e, "de cada mil crianças que a rua 'adota', um 'vira médico' os outros novecentos e noventa e nove 'viram bandidos'."

É necessário portanto, que os profissionais das áreas de psicologia, e sobretudo, de direito, tenham consciência do seu papel na sociedade, de buscar acima de tudo o bem geral da população.

É preciso que os advogados sejam treinados à deixar de lado o aspecto adversárial que se aprende nas faculdades do país, para que possam compreender de uma vez por todas, que o seu papel, não é simplesmente o de "vencer a lide", e sim, o de resolver o problema de seu cliente, pois "mais vale um péssimo acordo que uma boa lide".

O advogado não deve, durante o processo, deixar de lado os interesses do seu cliente para buscar seus interesses pessoais (como, por exemplo, o de vencer a lide a todo custo, para assim conseguir se promover, mostrando-se um profissional extremamente competente, pois “ganha todas as lides que disputa”).

O advogado, é contratado, não para "ganhar" ou "perder", mas sim para resolver um problema.

Fonte: Escritório Online


Enviar este artigo para um amigo                            Imprimir


Para solicitar o e-mail do autor deste artigo, escreva: editor@escritorioonline.com



© 1999-2012 Escritório Online. Direitos Reservados. Leis 9.609 e 9.610/98.


Publicidade