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Escritório Online :: Artigos » Direito Processual do Trabalho


As contribuições de terceiro e a Justiça do Trabalho Brasileira

05/10/2003
 
Marcos Sampaio de Souza



Após a edição da Emenda Constitucional nº 20/1998[1], que acrescentou o §3º ao art. 114 da CF/88, foi retirada parcela do poder de jurisdição da Justiça Federal, para cometer à Justiça do Trabalho competência para conduzir execução em favor de entidade autárquica federal.

Referida emenda atribuiu à Justiça do Trabalho a competência para executar, de ofício, as contribuições sociais previstas no artigo 195, I, “a”[2] e II[3] da Carta, bem como seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir.

A jurisprudência recente tem confirmado que o § 3º acrescido ao artigo 114 da Constituição da República contém todos os elementos para dotar a norma de eficácia plena, sendo desnecessária a atuação legislativa para que se adote a novel norma constitucional.

Deveras, já se definem legalmente os parâmetros para fixação das cotas previdenciárias, pela Lei nº 8.212/91. Também existe, no ordenamento positivo, diploma legal que rege a execução fiscal (ou seja, em favor da Fazenda Pública) - Lei nº 6.830/80. Conclui-se que o novo dispositivo (§ 3º do art. 114/CF) opera com incidência imediata, não carecendo de regras infraconstitucionais para conferir-lhe plena aplicabilidade direta e integral.

Dispõe o caput do art. 3º da Lei nº 8.212, de 24.07.1991 (com a redação dada pela Lei nº 8.620, de 05.01.1993), que trata do sistema de custeio da Previdência Social que “nas ações trabalhistas de que resultar o pagamento de direitos sujeitos à incidência de contribuição previdenciária, o juiz, sob pena de responsabilidade, determinará o imediato recolhimento das importâncias devidas à Seguridade Social".

Por seu turno, o artigo 44 da referida lei impõe a autoridade judiciária velar “pelo fiel cumprimento do disposto no artigo anterior, inclusive fazendo expedir notificação ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, dando-lhe ciência dos termos da sentença ou do acordo celebrado"

ODONEL URBANO GONÇALES[4], comentando os dispositivos legais acima afirma que "O Juiz do Trabalho, na hipótese, transforma-se em órgão fiscalizador do Seguro Social, porquanto lhe cumpre, sob pena de responsabilidade, determinar tal recolhimento. Considerada a competência reservada à Justiça do Trabalho no artigo 114 da Constituição Federal, vem à tona a inconstitucionalidade da expressão 'sob pena de responsabilidade', inserida no artigo.”

Posiciona-se desta maneira por entender que não é atribuição do Juiz do Trabalho verificar a correção do recolhimento, posto que isto cabe ao órgão competente do Instituto Nacional do Seguro Social.

Preliminarmente deve-se evidenciar o desiderato financista da referida Emenda, especialmente em face do seu despropósito político-institucional[5]. Ao prescrever que a execução se procederia de ofício, o constituinte derivado, aparentemente, enleou as figuras do procurador autárquico e do magistrado trabalhista, impondo a este que fizesse as vezes daquele.

A modificação legal subestima o juiz do trabalho, pretendendo utilizá-lo, no particular, como mero agente arrecadador das contribuições parafiscais, desprezando o fato de que é ele, dentre todos e por excelência, o agente político de sensibilidade social mais depurada.

Paradoxalmente, o legislador superestimou a estrutura administrativa da Justiça do Trabalho, ao determinar que a conta de liquidação, “inclusive da contribuição previdenciária incidente”, fosse elaborada pela parte “ou pelos órgãos auxiliares da Justiça do Trabalho” (artigo 879, §§ 1º-A e 3º, da CLT, com a redação dada pela Lei 10.035/00), sem considerar a complexidade dos cálculos de aferição e atualização dos débitos previdenciários.

Não bastassem estas dificuldades institucionais e operacionais introduzidas pela nova sistemática, a modificação ainda contribuiu para a complexidade da já ineficiente execução trabalhista, ao introduzir nela uma nova lide (na acepção carnellutiana) envolvendo o INSS[6], de um lado, e as partes, do outro.

Embora se sustente que o procedimento unificado, tal como concebido, propicia uma economia de atos processuais, pensamos que o ideal seria primeiro exaurir-se a execução trabalhista, para somente então ter início a execução fiscal. Na forma como está, o trabalhador, único titular da demanda cognitiva e dela vencedor, poderá facilmente ver embaraçado o recebimento de seus direitos, reconhecidos pelo Estado, por conta de incidentes relacionados ao débito previdenciário

Em decorrência de tudo isto, tanto o INSS[7] quanto as Secretarias das Varas do Trabalho vêm incluindo nos cálculos elaborados as contribuições sociais e as “contribuições de terceiros” (sistema “S”) que são, ordinariamente, voltadas ao interesse das categorias profissionais ou econômicas.

Referidas contribuições de terceiros encontram suporte nos artigos 149, 150, III, "b", 154, I, 195, I, §§ 4º e 6º e 240 da CF/88 e se referem à SESI, Serviço Social do Comércio - SESC, Serviço Social do Transporte - SEST, Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial - SENAI, Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial - SENAC, Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte - SENAT, Serviço Brasileiro de Apoio às Micros e Pequenas Empresas - SEBRAE e Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, dentre outros.

Contudo não foram inseridos expressamente no art. 114 da CF/88, que no §3º remete tão somente ao artigo 195, I, “a” e II. Não estando as contribuições de terceiros incluídas no referida relação, falece a Justiça do Trabalho competência para proceder a sua execução.

Apesar de tudo, a alteração legislativa não teve o condão de atribuir-lhe competência para promover a exação de todas as contribuições, posto que na novel competência atribuída à Justiça Especializada não está incluída a cobrança da contribuição de terceiros.

A sua competência material encontra-se estabelecida no art. 114 da CF/88 e está adstrita a conciliação e julgamento dos dissídios individuais e coletivos resultante dos contratos de trabalho, podendo executar as contribuições do empregado e do empregador, mas não a para terceiros.

Esclareça-se que, na forma do parágrafo único, do art. 1º, da Lei nº 8.212/91, essas contribuições para terceiros não constituem contribuição social para a seguridade.

De acordo com o parágrafo único, do art. 11, da Lei nº 8212/91, elas não podem ser assim classificadas porque não se lhes aplicam as regras impostas às contribuições para a seguridade social, dentre as quais destacar o princípio da solidariedade universal.

As contribuições sociais[8] são classificadas em contribuições de: (a) seguridade social, disciplinadas nos artigos 195, I, II e III da CF/88; (b) outras de seguridade social, art. 195, §4º da CF/88; e, (c) sociais gerais, previstas no art. 149, 212, §5º e 240 da CF/88. Somente as primeiras poderão ser cobradas no âmbito da Justiça do Trabalho. Reforça ainda mais este entendimento a verificação da regra do art. 240, também da CF/88, na qual se faz a expressa ressalva das contribuições para terceiros.

As contribuições sociais gerais referem-se ao interesse das categorias profissionais ou econômicas, e a elas não se lhe aplicam as regras impostas às contribuições para a seguridade social[9], salvo quanto à observância da anterioridade mitigada.

O TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 3ª REGIÃO vem confirmando, em vários julgamentos, esta orientação no sentido de negar competência a Justiça do Trabalho para executar as contribuições de terceiros[10], embora em decisão ainda não uniforme[11]. Os TRIBUNAIS DO TRABALHO DA 4ª[12] E 5ª REGIÕES têm julgado no mesmo sentido.

Como se pode verificar, o Poder Constituinte derivado não atribuiu competência ao Judiciário Trabalhista para cobrar as contribuições de terceiros, mesmo que decorrentes das sentenças por ele proferidas, revelando-se, dessarte, contrária a ordem constitucional as reiteradas investidas que vêm sendo promovidas pelo INSS, naquela Justiça.

Assim, mesmo que se venha a admitir o descompasso institucional acima referido, é salutar esclarecer que este se limitou as contribuições sociais para a seguridade e não a todas contribuições, pelo que evidente a incompetência da Justiça do Trabalho para promover a execução.


Notas do texto:


[1] DOU 16.12.1998

[2] Contribuições sociais devidas pelo empregador, empresa e entidade a ele equiparada, incidentes sobre a folha de pagamento.

[3] Contribuições sociais devidas pelo trabalhador e pelos demais segurados da previdência social.

[4] In "Seguridade Social Comentada", São Paulo: LTr, 1997, p. 55.

[5] Neste sentido, registre-se a lúcida opinião de JOSÉ AUGUSTO RODRIGUES PINTO, que observa a intenção antecedente da emenda “de transformar a Justiça do Trabalho em órgão complementar de arrecadação de contribuições previdenciais” (In Os graves embaraços processuais da Emenda Constitucional n. 20/98, publicada na Revista LTr 63-05/599-609).

[6] O INSS tem ingressado nos processos trabalhistas para impugnar cálculos, valendo-se dos meios e recursos inerentes ao devido processo legal para defesa dos interesses próprios de arrecadação das contribuições previdenciárias, não raramente tornando a execução trabalhista ainda mais caótica e menos eficaz.

[7] Através do INSS em razão de ter o art. 94 da Lei nº 8212/91 estabelecido delegação ao INSS para arrecadar e fiscalizar, mediante remuneração de 3,5% do montante arrecadado, contribuição por lei devida a terceiros, desde que o cálculo tenha a mesma base de apuração das contribuições incidentes sobre a remuneração paga ao segurado.

[8] As contribuições parafiscais são classificadas (ver STF, RE nº 148.754/RJ) em sociais; interventivas e corporativas.

[9] TRF 1ª Região, AC nº 38000365888/MG – 4ª T. – Rel. Juiz Hilton Queiroz – DJU 18.04.2002 – p. 71.

[10] CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA – COTA DE TERCEIROS – INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA A EXECUÇÃO – A Emenda Constitucional nº 20/98 atribui competência à Justiça do Trabalho para executar as contribuições sociais previstas no art. 195, I, a, e II, e seus acréscimos legais decorrentes das sentenças que proferir, sendo que, de acordo com o parágrafo único do art. 11 da Lei nº 8212/91, as contribuições de terceiros não constituem contribuição social. Logo, a Justiça do Trabalho não tem competência para executá-las. (TRT 3ª R. – 1ª T. – AP 10/02 – Rel. Juiz José Marlon Freita, julgado na Sessão de 08.04.2002). (TRT 3ª Região, AP 0408/02 – 1ª T. – Relª Juíza Cleube de Freitas Pereira – DJMG 03.05.2002 – p. 06)

[11] A divergência pode ser conferida no julgamento do Agravo de Petição nº 7832/01, 5ª Turma, Relatado pelo Juiz Eduardo Augusto Lobato, publicado no DJMG de 04.05.2002, página 14, sob o fundamento, ao nosso ver bastante inconsistente, de que as contribuições para terceiros “seriam uma obrigação acessória do recolhimento das contribuições previdenciárias”.

[12] INSS – DESCONTO DE PARCELAS DEVIDAS A TERCEIROS – As contribuições sociais de que trata o artigo 94 e seu parágrafo único da Lei 8.212/91, não são da competência da Justiça do Trabalho, em que pese o disposto na regra do § 3º do artigo 114 da CF/88. É que a cobrança das contribuições sociais referidas no artigo 195 da Carta Maior, no caso das entidades privadas de serviço social e de formação profissional, encontra-se excepcionada no artigo 240 da norma constitucional. Apelo a que se nega provimento. (TRT 4ª Região, AP 00169.017/98-2 – 1ª T. – Relª Juíza Irmgard Catarina Ledur – J. 25.07.2002).

Fonte: Escritório Online


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