:: Seu mega portal jurídico :: inicial | sobre o site | anuncie neste site | privacidade | fale conosco
        

  Canais
  Artigos
  Petições
  Notícias
Boletins informativos
Indique o
Escritório Online
 

Escritório Online :: Artigos » Direito Processual Penal


O Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) na Lei nº 10.792/03 e as facções criminosas

25/07/2004
 
Higor Vinicius Nogueira Jorge



"O crime organizado age assim: comanda, rouba, trafica e mata".
Percival de Souza


No dia 02 de janeiro de 2003 entrou em vigor a Lei nº 10.792 que alterou a Lei de Execuções Penais e o Código de Processo Penal. Dentre as alterações chama a atenção, além do aprimoramento de normas relativas ao interrogatório, a previsão do Regime Disciplinar Diferenciado (RDD).

Um dos principais motivos que ensejaram a aprovação do RDD foi à atuação de facções criminosas em presídios, principalmente nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro.


1. Facções criminosas nos presídios


Conforme RENATO LAÉRCIO TALLI, em seu livro À sombra do Medo, a primeira organização criminosa atuando em presídios que se tem notícia no Estado de São Paulo “ficou conhecida como as Serpentes Negras” e na sua origem “objetivava exclusivamente a melhoria das condições de vida dos sentenciados da Penitenciária do Estado”. Com o tempo, a facção “passou a monopolizar o tráfico de drogas” e a praticar outros crimes.

Após, surgiram outras organizações cujas semelhanças residem especialmente na crueldade infligida contra aqueles que não cooperam ou que traem o grupo. São também organizações criminosas o Primeiro Comando da Capital (PCC), o Comando Revolucionário Brasileiro da Criminalidade (CRBC), a Comissão Democrática de Liberdade (CDL), a Seita Satânica (SS) e o Comando Jovem Vermelho da Criminalidade (CJVC).

De acordo com o autor acima citado, o Comando Revolucionário Brasileiro da Criminalidade (CRBC) é uma organização criminosa restrita à Penitenciária de Guarulhos-SP, que não admite presos que já integraram o PCC e que recentemente confeccionou camisetas com as iniciais do comando e a inscrição: sou da paz.

A Comissão Democrática de Liberdade (CDL) teve origem na Penitenciária I de Avaré, aproximadamente no ano de 1996, quando o novo Juiz Corregedor dos Presídios da Comarca, com o objetivo de conhecer o perfil da massa carcerária, solicitou à direção da Penitenciária a presença dos presos mais antigos e utilizando um diálogo informal, demonstrou que deveriam pautar a vida carcerária na disciplina e ordem, colaborando com a administração pois desta forma “não teriam os seus pedidos de benefícios prejudicados, tudo de acordo com a lei”.

Em razão disso, os presos, provavelmente admirados com as palavras que ouviram, começaram a pregar aos seus pares a ordem e a disciplina, contudo depois de um certo tempo, qualquer transgressão as regras impostas pelos líderes proporcionava diversos tipos de castigos e os integrantes da facção passaram a se locomover pelo presídio usando camisetas com as siglas CDL e portando estiletes ostensivamente. Nesse contexto, a direção do presídio “acomodou-se, tendo em vista que a disciplina era comandada pela liderança do movimento”, até que a Secretaria da Administração Penitenciária prevendo as conseqüências que esta inversão de valores poderia ocasionar, substituiu a direção do presídio e transferiu os presos.

A Seita Satânica (SS) e o Comando Jovem Vermelho da Criminalidade (CJVC) são organizações criminosas de menor expressão, mas também são extremamente violentos. Uma das características da Seita Satânica é que seus integrantes são obrigados a cortar a falange do dedo mínimo.

Atualmente o PCC (que segundo reportagem da Revista Isto É, edição 145 de 26/02/01, surgiu a partir da facção Serpentes Negras) é a organização criminosa que mais tem gerado conflitos nos presídios, inclusive foi a responsável pela maior rebelião da história do país, no dia 18 de fevereiro de 2001, que sublevou simultaneamente 29 presídios e contou com o apoio de aproximadamente 29 mil detentos.

Conforme a Revista Isto É, uma investigação da Polícia Civil do Estado de São Paulo, descobriu que além de atuar na Penitenciária do Estado, também “existia nas unidades de Sorocaba, Iaras, Presidente Bernardes, Mirandópolis e no Complexo Penitenciário Campinas-Hortolândia. Fora de São Paulo, o comando atua na Penitenciária Central do Paraná e nas Penitenciárias de Segurança Máxima de Rondonópolis, no Mato Grosso, e Porto Velho, em Rondônia”.

O PCC reúne hoje aproximadamente 9 mil detentos, que representam 10% de todos os presos do Estado, e estima-se que tenha R$ 50 milhões no caixa que é utilizado para pagar despesas com advogados, financiar crimes e fugas e subornar policiais.


2. A Lei nº 10.792/03


A finalidade do RDD é efetivamente segregar presos provisórios ou condenados, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade ou sobre o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, em organizações criminosas, quadrilha ou bando.

O recém alterado artigo 52 da Lei de Execuções Penais determina a aplicação do RDD, nas hipóteses em que houver a prática de fato previsto com crime doloso e que ocasione a subversão da ordem ou disciplina internas.

Antes da promulgação da Lei nº 10.792, em razão da Resolução da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP – 26, de 04/05/01), nos presídios do Estado de São Paulo era admitido o Regime Disciplinar Diferenciado, de forma que a Lei em comento teve o condão de, como afirmou Luiz Flávio Gomes em artigo sobre o tema, materializar “na lei os regulamentos disciplinares de estabelecimentos penais de segurança máxima do Rio de Janeiro e São Paulo” que previam o RDD, “especialmente após o assassinato, no dia 15 de março de 2003, do juiz corregedor da Vara de Execuções Criminais de Presidente Prudente, Antônio José Machado Dias, cuja aplicação se deu para o traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira Mar, transferido desde maio de 2003 para o presídio de segurança máxima de Presidente Bernardes/SP”.

O RDD previsto pela Lei em discussão proporciona um absoluto isolamento dos presos e impossibilita principalmente que do interior dos presídios os líderes de grupos criminosos continuem comandar tais grupos, como vem ocorrendo em alguns presídios, segundo a imprensa tem divulgado. Uma constatação dessa afirmativa foi o caso dos criminosos que comandavam o tráfico de drogas do interior de um presídio de segurança máxima no Rio de Janeiro.

Dentre as principais características do RDD, temos:

- duração máxima de 360 (trezentos e sessenta) dias, sendo que a sanção pode ser repetida em caso de nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada;

- recolhimento em cela individual;

- visitas semanais de duas pessoas, sem contar crianças, com duração de 2 (duas) horas;

- direito de saída da cela para banho de sol por 2 (duas) horas diárias;

- possibilidade de isolamento preventivo do preso, que aguarda autorização judicial para ser submetido ao regime, por até 10 (dez) dias, sem autorização judicial e sem prejuízo do procedimento disciplinar a ser instaurado;

Também, como medidas previstas na Lei e direcionadas a promover o isolamento é importante ressaltar a previsão de instalação de detectores de metais nos presídios submetendo ao detector todos que adentrarem o estabelecimento (art. 3º - os estabelecimentos penitenciários disporão de aparelho detector de metais, aos quais devem se submeter todos os que queiram ter acesso ao referido estabelecimento, ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública) e também a utilização de bloqueadores de celulares e rádio-transmissores (art. 4º - Os estabelecimentos penitenciários, especialmente os destinados ao regime disciplinar diferenciado, disporão, dentre outros equipamentos de segurança, de bloqueadores de telecomunicação para telefones celulares, rádio-transmissores e outros meios, definidos no art. 60, § 1º, da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997).

É importante destacar também que apesar de posições favoráveis ao RDD, alguns estudiosos do direito se declararam contrários a esse Regime.

Roberto Delmanto em artigo publicado no Boletim do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, proclamou que o RDD fere a Constituição da República, que dispõe, em cláusulas pétreas que “ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante (art. 5o, III) e que não haverá penas ... cruéis (art. 5o, XLVII, e); o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova York (arts. 7o e 10); e a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (art. 5o, 2); os dois últimos, com disposições semelhantes, ratificadas pelo Brasil entendemos que o RDD é uma medida há muito tempo reclamada pelas instituições responsáveis pelo deve ser festejado, tendo em vista que os presos que subvertam a ordem devem receber um tratamento mais rigoroso.

Nesse contexto, apesar das opiniões de doutrinadores de destaque no sentido da inconstitucionalidade do RDD deve-se levar em consideração a instabilidade social e o terror que as rebeliões têm gerado dentro e fora dos presídios, de forma que a criação de um regime mais severo é uma necessidade imperiosa que há muito já devia ter se tornado realidade.


* Texto redigido maio de 2004.

Fonte: Escritório Online


Enviar este artigo para um amigo                            Imprimir


Para solicitar o e-mail do autor deste artigo, escreva: editor@escritorioonline.com



© 1999-2012 Escritório Online. Direitos Reservados. Leis 9.609 e 9.610/98.


Publicidade