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Apontamentos sobre o processo disciplinar na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)

05/03/2005
 
Celso Augusto Coccaro Filho



As questões relativas ao processo destinado à apuração de infrações e aplicação de sanções disciplinares aos advogados, a princípio de rara incidência nos Exames de Ordem, têm se tornado freqüentes.

No último Exame (124.º) realizado pelo Conselho Seccional de São Paulo, 5, entre 10 questões, abordaram a matéria, o que recomenda o delineamento dos seguintes apontamentos:


1. O processo disciplinar é objeto do Estatuto da OAB (Lei n. 8.906/94), do Código de Ética e Disciplina, do Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e a OAB, de Provimentos do Conselho Federal e dos Conselhos Seccionais e dos Regimentos Internos dos Tribunais de Ética.


O candidato ao Exame de Ordem não deve restringir seu estudo ao Estatuto, induzido pela idéia de que aquele diploma concentra normas principais ou gerais, de forma suficiente e exauriente. Questões procedimentais relevantes são tratadas pelo Código de Ética; o Regulamento Geral se aprofunda nas notificações e nos recursos, pouco abordados nos outros diplomas.


2. Prevê o Estatuto, no art. 68, a aplicação subsidiária, ao processo disciplinar, das normas da legislação processual penal.


As normas relativas a procedimentos administrativos e da legislação processual civil, nessa ordem, são subsidiariamente aplicadas aos demais processos previstos no Estatuto, isto é, aqueles que não se destinam à apuração e aplicação de sanções disciplinares, tais quais pedidos de inscrição suplementar, cancelamento de inscrição, licenciamento do advogado, relativos a eleições e inúmeros outros.

Exemplo recorrente da integração normativa é a inspiração suscitada pela mutatio libelli do art. 384 do Código de Processo Penal.

Ao analisar a representação e a defesa prévia, o relator poderá propor o seu arquivamento (art. 73, § 2.º, do Estatuto e art. 51, § 2.º, do Código de Ética) ou a instauração do procedimento (art. 52, § 2.º, do Código de Ética). Nesse momento, aponta o dispositivo legal que permite a subsunção e que deverá gizar a instrução processual, em decisão que o Código de Ética chama de “despacho saneador”.

As representações, porém, são usualmente formuladas por leigos, sem qualquer apuro técnico; as defesas, diante de imputação imprecisa, tendem ao laconismo, à oposição genérica ou à desqualificação ofensiva da parte representante.

Diante desse quadro, que ainda não lhe permite visão precisa dos fatos, o “advogado assessor” procede à capitulação da conduta.

A instrução costuma descortinar outro panorama, às vezes, mais grave, outras dando ensejo à conclusão de inexistência de infração.

Estará o julgamento adstrito à capitulação consignada no despacho que redundou na instauração do processo?

O Conselho Federal não entende dessa maneira: “Assim, é possível durante a instrução processual, ou até mesmo na fase recursal, ocorrer novo enquadramento jurídico da conduta infracional do representado, aplicando-se pena diversa daquela inicialmente prevista, desde que os fatos sejam os mesmos” (Ementa n. 102/2003/SCA, Recurso n. 0089/2003/SCA/SP, DJ de 2.10.2003, p. 516). “O representado se defende do fato que lhe é imputado, e não da capitulação jurídica que lhe é atribuída.” (Ementa n. 014/2004/SCA, Recurso n. 0270/2003/SCA/PR, DJ de 1.º.4.2004, p. 409).

Observado o contraditório, concedida ao representado a possibilidade de se opor aos fatos que lhe são imputados, o julgamento não se restringe à infração capitulada na promoção que antecede a instauração.

Tendo conhecimento, porém, de fato hábil a constituir violação disciplinar, verificado no curso do processo, em torno do qual não se constituiu a controvérsia, restará ao advogado relator a promoção de representação ex officio, que poderá dar ensejo à instrução de outro processo disciplinar, vedado o julgamento naqueles autos, por inquestionável lesão ao due process of law.


3. Os prazos processuais são, invariavelmente, de 15 dias: apresentação de defesa, manifestações nos autos, interposição de recursos. O prazo para apresentação de defesa prévia poderá ser prorrogado, a juízo do relator, quando exposto motivo relevante (coleta de elementos, desarquivamento de autos processuais etc.).


4. Sob a ótica do princípio da ação, o processo disciplinar é acusatório ou inquisitivo?


Prepondera a instrumentalidade. A instauração do processo disciplinar decorre de representação, ou de ato de ofício, praticado pelo Presidente do Conselho Seccional ou do Tribunal de Ética. A representação não exige rigor algum, nem de forma, nem de conteúdo. Não há necessidade de advogado. Qualquer pessoa, munida de fundamentos razoáveis, poderá formulá-la verbalmente, hipótese em que funcionários do Tribunal de Ética, do Conselho Seccional ou das Subseções deverão tomá-la a termo.

Evita-se que entraves formais sirvam a interesses mesquinhos da Corporação.

A representação não pode, porém, ser anônima (art. 51 do Código de Ética), o que gera a assunção de responsabilidade daquele que a apresenta e restringe a utilização temerária ou abusiva.

Retornando, porém, à indagação: o processo é acusatório ou inquisitivo?

Nos processos disciplinares, é corriqueira a escassez de manifestações da parte representante, usualmente restritas à própria representação. Elaborada esta, afasta-se o seu autor, alheio a seu desenlace, da realização de provas ou da impugnação das razões de defesa.

Muitas vezes, a parte representante se arrepende; passada a exasperação, esfriados os ânimos, chega a “retirar a queixa”; outras vezes, consegue a redução no valor de honorários ou favores semelhantes.

Ocorre que o interesse na apuração dos fatos e aplicação de sanções disciplinares é público, indisponível. Extravasa o interesse da classe; são indubitáveis os benefícios coletivos da punição do advogado infrator, que deve prestar, afinal, serviço público, gizado pela função social (art. 2.º, § 1.º, do Estatuto).

O procedimento precisa ser impulsionado, dessa forma, pelo órgão encarregado da aplicação da pena (que, cabe recordar, pode até representar de ofício).

Daí a incidência do princípio do impulso oficial; cabe aos advogados que atuam nos processos disciplinares, designados genericamente “relatores”, suprir a ausência dos atos que deveriam, a rigor, ser praticados pela parte representante, neles interessada. Tais “relatores”, além de assumir o impulso processual, têm inúmeras funções: emitem o parecer preliminar (art. 51, § 2.º e § 5.º, do Código de Ética); determinam as notificações (art. 52); presidem a instrução (art. 73 do Estatuto); determinam diligências variadas (art. 52, § 2.º, do Código de Ética) e, enfim, julgam (art. 56 do Estatuto).

A plêiade de funções, aliada à necessidade de impelir o processo, é hábil para gerar a conclusão de que os tais relatores, ligados psiquicamente ao dever de investigar “para punir”, são parciais e de que o processo é inquisitivo.

A prática, porém, revela-se outra: o “relator” que julga não é o mesmo que preside a instrução (denominado, nos Tribunais de Ética do Conselho Seccional de São Paulo, “instrutor”); é outro, também, aquele que profere o parecer preliminar à instauração ou arquivamento (denominado “assessor da Presidência”).

Logo, não se estabelece a temida vinculação psíquica, que conspira com a parcialidade.

Ademais, o contraditório, raramente observado nos processos inquisitivos, é meticulosamente preservado, em todas as etapas processuais, com a nomeação obrigatória de defensor dativo à parte representada, quando não encontrada, ou, quando encontrada e notificada, for revel (art. 73, § 4.º, do Estatuto).

Exemplo não observado no Judiciário, a sustentação oral das razões de defesa é apresentada após o voto do relator (art. 53, § 3.º, do Código de Ética) e não constitui mera retórica, eis que assume saudável caráter antitético.

A irrestrita garantia de contraditório e a publicidade de todos os atos (guardando-se o sigilo, como será adiante exposto) propiciam a paridade processual e permitem incluir o processo disciplinar entre aqueles de natureza acusatória.


5. A competência para aplicação das sanções disciplinares cabe ao Tribunal de Ética e Disciplina do Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração (art. 70 do Estatuto).


O critério que norteava a lei anterior era outro: a competência era atribuída ao Conselho Seccional da inscrição principal do advogado.

Há exceções: a) as infrações cometidas perante o Conselho Federal (usurpação de suas funções, por exemplo), são por ele julgadas; b) também cabe ao Conselho Federal o julgamento das infrações praticadas pelos seus membros e pelos Presidentes dos Conselhos Seccionais (art. 51, § 3.º, do Código de Ética), por prerrogativa de função; c) compete ao Tribunal de Ética e Disciplina do Conselho Seccional onde o acusado tenha a inscrição principal, o processamento e a aplicação da pena de suspensão preventiva (art. 70, § 3.º, do Estatuto). Nessa hipótese, o processo disciplinar instaurado na seqüência (a suspensão preventiva tem o caráter de medida cautelar preparatória) será também julgado pelo Tribunal de Ética do Conselho da inscrição principal, excepcionando-se a regra de competência territorial.


6. O processo disciplinar deve tramitar em sigilo, até o seu término (art. 72, § 2.º, do Estatuto).


A preservação da imagem e nome dos envolvidos é positiva; a mera existência de processo disciplinar, não definitivamente julgado, pode submeter o acusado a constrangimentos indevidos e a descrédito profissional, não arredados pela absolvição. O sigilo também inibe intuitos emulatórios e pode submeter o advogado que o rompe a sanções disciplinares, que serão apuradas em outro processo.

Após o julgamento definitivo, cessa o segredo.

O cumprimento de algumas penas, aliás, como a suspensão do exercício das atividades profissionais e a exclusão, pressupõe ampla publicidade, que lhes possibilita a execução e cumprimento (comunicação aos Tribunais da pena de suspensão aplicada a advogado, por exemplo).

Até mesmo as notificações do representado, quando feitas por edital, devem observar o sigilo. Estipula o art. 137-A, § 3.º, do Regulamento Geral do Estatuto que delas não pode “constar qualquer referência de que se trate de matéria disciplinar, constando apenas o nome completo do advogado, o seu número de inscrição e a observação de que ele deverá comparecer à sede do Conselho Seccional ou da Subseção para tratar de assunto do seu interesse”.

O Estatuto excepciona as partes envolvidas (representante e representado) e seus defensores, como não poderia deixar de ser. Também ressalva a autoridade judiciária competente, a ela possibilitando o acesso às informações do processo.

Quem é a tal “autoridade judiciária competente”? Poderá a parte representante, a título de exemplo, apresentar cópias das peças do processo disciplinar numa ação cível movida em face do advogado representado? O juiz daquele feito pode ser tido como a “autoridade judiciária” contemplada na exceção legal?

O Conselho Federal abordou a matéria e a definiu com acuidade, no Proc. n. 2.015/99/SCA/MS, DJ de 26.11.1999, p. 400, s. 1:

Exibição em juízo de peças do processo disciplinar. Violação do sigilo. Autoridade judiciária competente. A hipótese de violação ao sigilo profissional é ampla, pois incide sobre toda divulgação de fatos, documentos ou informações obtidas em decorrência do exercício da advocacia, quer sejam concernentes à pessoa do cliente ou de qualquer outra pessoa. E por autoridade judiciária competente deve-se compreender o juízo cível ou criminal instado a decidir ação judicial que verse sobre a conduta do advogado ou um mandado de segurança que vise invalidar sanção imposta através de processo disciplinar. Mas usar peças de um processo disciplinar para produzir alegações nos autos de uma ação cível de cobrança, sem qualquer liame com os fatos tratados no processo disciplinar, não se enquadra na hipótese do art. 72, § 2.º, porquanto aquele não seja juízo competente para apreciar tais questões.

Logo, “autoridade competente” é aquela que deverá atuar em processo no qual a conduta do advogado tenha relevância, como causa de pedir, ou coincida com outra definida como crime, no processo penal, ou ainda cujo objeto é o próprio processo disciplinar (mandados de segurança, declaratórias de nulidade, ações constitutivas negativas).

Já considerou o Conselho Federal, sob outra ótica, que a “quebra de sigilo do processo disciplinar não leva à nulidade dos seus atos, tendo como conseqüência a infração disciplinar dos responsáveis” (Proc. n. 0040/2003/SCA, DJ de 16.7.2003, p. 47, s. 1).


7. Quais os recursos cabíveis?


Os recursos não são nominados, com exceção dos embargos de declaração; ostentam, tão-somente, a designação genérica que exalta sua finalidade.

Não há previsão de recursos contra decisões interlocutórias. São recorríveis apenas as decisões terminativas, de mérito ou não.

Os recursos têm efeito devolutivo e suspensivo, exceto aquele interposto contra a decisão que aplica a suspensão preventiva (art. 77 do Estatuto; as demais hipóteses nele mencionadas não dizem respeito ao processo disciplinar).

O prazo para interposição é uniforme: 15 dias, inclusive para os embargos de declaração.

A modalidade por último referida não é prevista no Estatuto ou no Código de Ética, mas no Regulamento Geral (art. 138), e destina-se a sanar omissões e lacunas, além de corrigir contradições. A decisão que os admite ou rejeita é irrecorrível.

Das decisões proferidas pelos Tribunais de Ética, unânimes ou não, cabe recurso ao Conselho Seccional (art. 76 do Estatuto), que será julgado pelo plenário ou órgão especial equivalente (art. 144 do Regulamento Geral).

Das decisões proferidas pelo Conselho Seccional cabe recurso ao Conselho Federal, nas seguintes hipóteses: a) quando não unânimes, tenham ou não alterado a decisão de primeiro grau; b) quando unânimes, contrariarem o Estatuto, o Regulamento Geral, o Código de Ética, os Provimentos e decisão do Conselho Federal ou de outro Conselho Seccional.

Têm legitimidade recursal tanto o representante quanto os representados, desde que demonstrem o interesse processual.


8. O Estatuto também prevê a revisão dos processos disciplinares (art. 73, § 5.º; no Código de Ética, art. 61), quando a decisão condenatória (e apenas ela):


a) decorre de erro de julgamento (dois exemplos, da casuística: “Há erro de julgamento quando o Conselho Federal, pretendendo manter a decisão do Conselho Seccional, fixa pena diversa e mais gravosa do que a penitência estabelecida em primeiro grau” (Proc. n. 1.493/94/SC, DJ de 25.9.1995, p. 31387); “Julgamento proferido em processo disciplinar, quando a prescrição da pretensão punitiva já se consumara, considera-se eivado de falha, caracterizando erro de julgamento e ensejando, portanto, pedido de revisão” (Proc. n. 0188/2003/SCA/DF, DJ de 16.7.2003, p. 48, s. 1);

b) é calcada em falsa prova.

A figura análoga dos arts. 621 a 627 do Código de Processo Penal (que se aplica subsidiariamente ao processo disciplinar, como já mencionado) permite extrair algumas conclusões: a) apenas detém legitimidade o advogado punido; b) revisão não é recurso; pressupõe o trânsito em julgado da decisão condenatória; c) pode ser parcial, com redução da pena, ou total, resultando na absolvição.

Fonte: Escritório Online


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