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Escritório Online :: Artigos » Direito Financeiro


A lei de responsabilidade fiscal e o poder de gasto

26/05/2000
 
Jorge Ulisses Jacoby Fernandes




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Excerto do livro Responsabilidade Fiscal, com lançamento no dia 24/05/2000 pela Editor Del Rey, de autoria dos profissionais abaixo mencionados
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* Jorge Ulisses Jacoby Fernandes,
Procurador do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do DF;

* Carlos Pinto Coelho Motta,
Professor da PUC e advogado;

* Jair Santana,
Magistrado;

* Léo da Silva Alves,
Presidente do Centro Ibero Americano de Administração e Direito - CEBRAD.
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Quando se faz referência à despesa pública, nem sempre se distinguem os dois aspectos imanentes ao trato dessa questão. Há que se considerar, de um lado, o próprio critério na aplicação dos recursos, ou seja, o ato ou decisão política que seleciona prioridades de dispêndio, limitadas pelo chamado "poder de gasto" da Administração; de outro, o aspecto mais formal do processamento da despesa, que envolve fidedignidade orçamentária, organização administrativa para a execução e controle financeiro eficiente. A análise de Aliomar Baleeiro vem demarcar a questão:
"Em todos os tempos e lugares, a escolha do objetivo da despesa envolve um ato político, que também se funda em critérios políticos, isto é, nas idéias, convicções, aspirações e interesses revelados no entrechoque dos grupos detentores do poder. Tanto mais lúcidos, cultos e moralizados sejam os governantes quanto mais probabilidades existem de que se realize aquele cálculo da máxima vantagem social.
Isso põe em contraste o aspecto político e o aspecto técnico da despesa pública...

À luz do primeiro, o político, delibera-se o que deve ser objeto da despesa pública, isto é, que necessidades humanas de caráter coletivo devem ser satisfeitas pelo processo do serviço público.

Assentada a deliberação nesse ponto preliminar, cumpre investigar o aspecto técnico: como obter o máximo de eficiência e de conveniência social com o mínimo de sacrifício social correspondente. Ou como desse sacrifício se poderá esperar o maior rendimento de proveitos para a comunidade politicamente organizada. É a tarefa dos técnicos.

Determinar quais as necessidades de um grupo social a serem satisfeitas por meio do serviço público e, portanto, pelo processo da despesa pública, ressalvada a hipótese de concessão, constitui missão dos órgãos políticos e questão essencialmente política".



Ao tratar do orçamento, nos artigos 165 a 169, a Constituição Federal revela, inquestionavelmente a preocupação do Constituinte em excluir do orçamento a ficção representada por um poder político efêmero, cujos critérios de dispêndio se caracterizam pelo interesse em "marcar" a todo custo seu período de gestão, com propósitos eleitoreiros ou de privilégio. A leitura da realidade brasileira expõe, desde os tempos do Brasil Colônia, essa característica do exercício do poder que onerou historicamente o tesouro nacional, empobreceu o povo e endividou o país.
Essa Expressão política se faz com alternância de poder no regime democrático pelo processo eleitoral e se concretiza na lei, inclusive a lei orçamentária.

O uso indevido da discricionaridade administrativa sempre foi objeto de denúncia por parte da imprensa indicadora de opinião e demandas do cidadão. Em 1982, conhecido periódico rememorava em um de seus editoriais as opiniões de um antigo comentarista político do Império, demonstrando sua atualidade:

"'A corrupção moral do país é um vício antigo', bradava – nas Cartas do Solitário – Tavares Bastos, que não se cansava de pesquisar as causas do fenômeno, a começar pela centralização do poder. 'Diz-se que o Brasil é uma terra habitada por milhões e milhões de pretendentes a empregos e graças', e ainda hoje se pode repetir a verificação, bem como apontar outras formas que o desenvolvimento multiplicou nas relações viciosas entre os poderes públicos e a sociedade.
Tavares Bastos, em sua Carta nº XXX, cita que...'geralmente os bons comerciantes evitam contratar com o Governo...em razão das preferências depois da concorrência... e as delongas no recebimento'.

Como não mudou o método, sobreviveu o mecanismo que acabou aperfeiçoado com novas técnicas operacionais".



Esforços para conter esse "mal" transpareciam, por exemplo, no texto do Código de Contabilidade Pública da União, de 1922. O Decreto Legislativo nº 4.536 de 28/1/1922, em seu art. 39, já considerava como "crimes de responsabilidade" os atos de governantes que atentassem contra as leis orçamentárias.
Tais dispositivos não lograram, todavia, induzir mudanças significativas na administração do poder de gasto dos entes políticos. Apesar da nº Lei 4.320/64, no art. 60, estabelecer categoricamente que não há despesa sem prévio empenho; apesar da preocupação da Constituinte de 1988 ao determinar o controle da administração; apesar das regras progressivamente mais rígidas e detalhistas dos estatutos de licitações e contratos, é forçoso reconhecer que o cenário atual não apresenta avanços consideráveis. O pagamento de contratos representa ainda em muitos casos verdadeira via crucis para o contratado, em face da desorganização orçamentária e financeira ainda subsistente.

Embora a LRF traga, indubitavelmente, maiores limitações e maior rigidez ao dispêndio público, não é de se esperar o fim definitivo das ilegalidades e irregularidades no processo decisório administrativo relativo à matéria. Todavia, a adequação administrativa a ser processada; a imposição de controles e sanções; a maior visibilidade dos atos orçamentários na gestão fiscal contribuirão, é certo, para um fortalecimento da dimensão ética na administração financeira dos entes políticos, sintetizado na meta de "melhoria do poder de gasto" e na máxima de que "não se deve gastar mais do que se arrecada".

Entre eles o previsto no § 1º do art. 59 que vem estabelecer novo instrumento de controle para os Tribunais de Contas.

Na persecução de tais metas, a letra legal explicita instrumentos como o sistema de custos (arts. 4º, I, "e"; 32, § 1º; e 50, § 3º), o controle da gestão fiscal (art. 48), o relatório resumido da execução orçamentária (art. 52). o relatório da gestão fiscal (art. 54), a obrigatoriedade de prestação de contas (art. 56), o parecer prévio dos Tribunais de Contas (arts. 57 e 58), entre outros mecanismos, alguns bastante inovadores, que o tempo se encarregará de solidificar.

Em auxílio dessas determinações virão, ainda, as funções ampliadas do Tribunal de Contas e do Ministério Público (art. 59), e a expectativa de que o movimento de divulgação, informação popular e debate em torno da LRF propicie um incremento da vigilância por parte do próprio cidadão, cada vez mais consciente de seus direitos.

Nesse quadro, a contabilidade pública passa a ter especial significado no processo decisório, na medida em que responderá pela confiabilidade das informações e qualidade da análise. As normas e princípios de contabilidade pública, os padrões contábeis utilizados, a articulação entre os demonstrativos e relatórios, o reconhecimento da necessidade da explicitação de uma estrutura de custos, associada à repercussão de medidas a médio prazo quanto ao impacto financeiro do empreendimento, sem dúvida irão valorizar esse ramo do conhecimento humano.

Para maior efetividade da Lei, impõe-se ainda o aprimoramento da prestação juridicional em nosso País, para que as sanções e penalidades tenham na Justiça um tratamento mais célere e simples. É o que se espera, sobretudo, com a agilização do PL 621/99, ainda em tramitação na Câmara dos Deputados.

Sob essa expressão pretende-se conceber a idéia da gestão do administrador público frente aos mais variados temas do Direito Administrativo, enquanto relacionados ao Direito Financeiro.

Na Argentina, conforme o magistério do eminente Eduardo Mertehikian, é aceito sem discussão o critério de que o orçamento público atua como norma habilitante da competência administrativa, plasmando-se como a norma jurídica que define direitos e impõe obrigações à direção dos órgãos administrativos.

No Brasil, essa noção não está bem assentada no quotidiano do Direito Administrativo.

Efetivamente, quando é abordado o tema competência busca-se no primeiro plano apenas a noção do poder que a lei outorga ao agente para o desempenho de suas respectivas funções. Carlos Pinto Coelho Motta assinala que a competência resulta sempre de uma lei que a delimita, é, pois, elemento vinculado ao ato administrativo, não podendo ser modificada ou transferida segundo a vontade do administrador. Para completar essa percepção unilateral da competência, há os que partindo da estrutura de ato válido do Direito Civil, para construir a estrutura do ato administrativo, acabam referindo-se a sujeito.

Daí a vantagem do entendimento de Eduardo Mertehikian, de que o orçamento atua como norma habilitante de competência administrativa.

Desse modo, por exemplo, se o orçamento não for aprovado até o início do exercício financeiro o agente tem sua competência, em tese, totalmente preservada, mas no caso concreto, somente exercitável até o limite de 1/12 (um doze avos) da despesa aprovada para o exercício anterior.

A responsabilidade passa, com a LRF, a ser personificada e personalizada, - sem prejuízo do princípio da impessoalidade da gestão, - otimizando não só o cumprimento da vontade do povo, consagrada no orçamento pelos seus legítimos representantes, quanto pela tutela legal, que se de um lado imputa sanções, – na Lei de Responsabilidade Fiscal ao ente federado ou empresa estatal dependente que não cumpriu aos ditames da responsabilidade fiscal –, mas dá espaço para a ação do controle definir o agente que por meio da pessoa jurídica violou a norma e alcançá-lo.

Fonte: Escritório Online


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