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Dano moral: loteria ou não?

18/10/2004
 
Rodrigo Fernando Rigatto



Recentemente entrou em vigor em nosso país o Novo Código Civil depois de uma longa caminhada que perdurou por aproximadamente 30 anos até a aprovação da tão esperada Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002, revogando o código de 1916. Em seu bojo, mudanças que se fizeram necessárias, outras tão importantes ausentaram-se de ser tratadas.

Muito se falou a respeito do que haveria mudado ou sobre o que deveria ser alterado diante de seus 2.046 artigos. Debates foram realizados a fim de esclarecer suas principais alterações. Grandes estudiosos do direito se encaixavam nas linhas da NOVA LEI para levar aos leigos suas inovações.

No entanto, um tema chamou mais a atenção, apesar de sua história advir antes mesmo que Cristo, porém, somente com o novo código teve seu preceito escrito, ou seja, a famosa RESPONSABILIDADE CIVIL que ganhou um capítulo próprio neste contexto, trazendo com isso a figura do DANO MORAL.

Sobre esse tema que quero tecer algumas linhas, a respeito da amplitude que se enquadra, o desejo fortemente está em buscar mais a perfeição do sentido usado, que levar a dúvida, apesar de o próprio estudo ser de sentido volumoso.

Sábios e geniosos estudiosos vêm ao longo dos tempos conceituar o que vem a ser o Dano Moral propriamente dito, qual sua conseqüências no ser humano, a que profundidade chegaria seus danos e a que pessoa atingiria. No entanto, a meu ver todas foram sem sucesso, haja vista não existir ainda mecanismos exatos (maquinas, formulas, etc) que descrevessem prontamente e minuciosamente a que amplitude foi abalada o sentimento daquele que sofreu esse mal. Tudo porque, se fossemos definir o que vem a ser Dano Moral, certamente teríamos mais de 165 milhões de significados, vez que, cada brasileiro tem em si um sentido exato do que acha ser, e qual grau lhe fora atingido.

No entanto, a princípio, podemos dizer que Dano Moral, como o próprio nome diz, é a ofensa à pessoa (física ou jurídica[1]), à sua moral. É a vergonha, a humilhação, o descaso, é o próprio repúdio, a desigualdade. É tudo o que abala o psíquico daquele ser, ou seja, é o desrespeito ao próximo, a tal ponto que lhe tire a vontade de viver, de sorrir, de se alimentar, de se ver ou sentir a vida. É todo o dano não Patrimonial, ou seja, não está ligado ao patrimônio do sujeito

Necessário se faz distinguir o Dano Moral do Dano Material ou Patrimonial, pois um não tem nada a ver com o outro. Enquanto que o Dano Material, como o próprio nome diz, está ligado a um bem material, por exemplo, carro, casa, etc., o Dano Moral está ligado à pessoa, seu sentimento, tudo que sente no seu interior, que não está ligado ao seu patrimônio.

Não existe dor mais forte que ser envergonhado em público; de presenciar sua honra ser atacada perante uma sociedade devassadora que ingere qualquer sentimento avassalador.

Quando há lesão injusta aos valores protegidos pelo direito, está presente à figura maciça do dano. Tudo que se faz com intuito de prejudicar, ofender, lesionar, fazendo com que esta pessoa entre na esfera da dor sofrida, estamos agindo no âmbito do DANO deste e consequentemente atingindo sua MORAL.

Já dizia Wilson Melo da Silva[2] ao classificar DANO MORAL como sendo:

“(...) lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição ao patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico.”

Em recente ementa publicada no Boletim da AASP (Associação dos Advogados de São Paulo), edição nº 2355, na data de 23 a 29 de fevereiro de 2004 – Caderno Pesquisa Monotemática, página 331, o Rel. Juiz Irineu Pedrotti, brilhantemente descreve o sentimento que rege o dano moral, e mais abaixo qualificou os meios não para apagar o dano, mas para esquivar do sofrimento, que peço vênia para transcrever:

“DANO MORAL. Caracterização. Dor e tristeza que se impõe a terceiro, sem repercussão patrimonial. Bens espirituais do homem que lhe são preciosos e queridos, tanto ou mais do que os bens materiais.
Ementa oficial: O dano moral pode ser considerado a dor, a tristeza, que se impõe a terceiro, de forma que não tenha repercussão alguma no patrimônio. Não pode, por isso, duvidar-se que o homem possui bens espirituais ou morais, que lhe são preciosos e queridos, tanto ou mais do que os bens materiais. Esses bens são, sem dúvida, complemento daqueles; pois fornecem meios, não somente para se obter duração, saúde e bem-estar físicos ou do corpo, mas também para se alcançar a saúde e o bem-estar morais ou do espírito, mediante alegrias, prazeres, doçuras afetivas, distrações, confortos, leituras, espetáculos naturais e artificiais, viagens encantos da vida”.
(2º Tacivil – 10ª Câm.; Ap. c/ Ver. nº 649.274-00/3-SP; Rel. Juiz Irineu Pedrotti; j. 26/6/2003; v.u.) RT 814/259

Os bens morais consistem no equilíbrio psicológico do ser humano, em seu bem-estar, no modo em viver a vida, na sua profissão, trabalho e reputação, no seu direito de ir e vir, e no seu relacionamento com a sociedade. Se esses bens forem ofendidos, surge o sofrimento, a dor, o desânimo, a angustia, o medo, o receio, a prostração, o abatimento e a dificuldade de se relacionar socialmente outra vez.

A jurisprudência assim posiciona:

DANO MORAL – Importam em dano moral o vexame, a humilhação, o sofrimento e/ou a dor que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflição, angústia e desequilíbrio do seu bem-estar. (TRT 5ª R. – RO 01847-2001-461-05-00-6 – (14.842/03) – 5ª T. – Relª Juíza Delza Karr – J. 02.09.2003)

DANO MORAL – COMPROVAÇÃO – DEFERIMENTO – O dano moral reside na dor pessoal, no sofrimento íntimo, no abalo psíquico e na ofensa à imagem que o indivíduo projeta no grupo social. A humilhação sofrida pelo trabalhador, causando-lhe lesão ao patrimônio imaterial, deve ser reparada. (TRT 14ª R. – RO 337/2003 – (00029.2003.031.14.00-4) – Rel. Juiz Shikou Sadahiro – DOJT 25.08.2003)

DANO MORAL – CABIMENTO – INDENIZAÇÃO – Caracterizado o dano moral causado à trabalhadora, por ofensa do empregador, a indenização deve ter valor razoável, suficiente a compensar-lhe a dor e o sofrimento suportados. (TRT 14ª R. – RO 0074/02 – (1532/02) – Relª Juíza Flora Maria Ribas Araujo – DJRO 28.11.2002)

DANO MORAL – EFETIVIDADE – INDENIZAÇÃO – Verificando o julgador a efetiva ocorrência do dano moral, de modo a causar dor, sofrimento e humilhação ao trabalhador, tem cabimento o deferimento do pedido de indenização pecuniária. (TRT 14ª R. – RO 0121/02 – (0705/02) – Relª Juíza Flora Maria Ribas Araújo – DOEAC 02.08.2002)

(...) O dano moral é aquele decorrente de ato capaz de provocar dor, sofrimento ou constrangimento no ofendido, fatores tais que, nem sempre, são visíveis externamente.(...) (TRT 15ª R. – Proc. 8492/01 – (44693/01) – 3ª T. – Rel. Juiz Carlos Eduardo Oliveira Dias – DOESP 22.10.2001 – p. 16)

(...) O dano moral é lesão de bem integrante da personalidade, tal como a honra, a liberdade, a saúde, a integridade psicológica, causando dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação à vítima. (...) (TRF 2ª R. – AC 2000.02.01.040982-4 – 1ª T. – Rel. Juiz Fed. Conv. Abel Gomes – DJU 27.11.2003 – p. 146/147)

(...) É inquestionável que as lesões sofridas pelo autor lhe causaram dor, sofrimento, angústia e por conseguinte afetou o seu bem-estar, além de causar-lhe aleijão irreversível. Tais admoestações traduzem o dano moral, que independe de prova do prejuízo, uma vez que é de difícil constatação, pois atinge a esfera interior ou subjetiva do indivíduo. (...) (TJDF – APC 20000110464622 – DF – 1ª T.Cív. – Rel. Des. José Divino de Oliveira – DJU 01.10.2003 – p. 34)

(...) Dano moral é reputado como sendo a dor, o vexame, o sofrimento ou a humilhação que, fugindo da normalidade, interfere no comportamento psicológico do indivíduo, causando aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. (...) (TJRS – APC 70004976767 – 9ª C.Cív. – Rel. Des. Adão Sérgio do Nascimento Cassiano – J. 18.06.2003)

(...) Segundo sevatier, "dano moral é todo sofrimento humano não suscetível de valoração econômica. Representa a dor, a tristeza, a humilhação ou até mesmo a amargura de ter sofrido uma lesão em sua esfera íntima". (...) (TRT 3ª R. – RO 7947/03 – 3ª T. – Relª Juíza Maria Cristina Diniz Caixeta – DJMG 19.07.2003 – p. 07)

Nesse compasso, enfocando o tema aqui estudado, vários artigos foram publicados tratando o Dano Moral como uma “Loteria”[3], o que, data vênia, não há sentido algum. Como bem sabemos, loteria é uma aposta onde o interessado vai até uma casa lotérica (convicto ou não) e faz seu jogo, paga a quantia correspondente e torce para ser o grande ganhador do tão desejado prêmio; o que não tem nada a ver com o tema aqui em questão.

Igualar esse tipo de jogo ao sofrimento de uma pessoa seria o mesmo que ignorar seus sentimentos e priva-lo de sua dor, o que é inadmissível e repugnante.

Tratar a esse pé de igualdade um assunto tão sério como esse, seria deixar totalmente desamparado o lesionado, e ainda apostar que seu psíquico só teria valor pecuniário onde podemos comprá-lo na grande maioria das vezes por quantias ínfimas, já que existem jogos de loteria que seus prêmios são baixíssimos, como por exemplo, as famosas “raspadinhas”, onde a recompensa ao acertador muitas vezes não passa dos cinqüenta centavos.

Outro ponto, na loteria podemos dividir o premio com outro ganhador, o que não ocorre com o sofredor do dano, pois muitas vezes este “agüenta” calado, não podendo compartilhar desse sentimento com mais ninguém.

Certo é que não apostamos dor, angustia, sentimentos, vergonha. Não apostamos a vida perdida, ou um braço arrancado, a deficiência ou a moléstia causada. Não nos conduzimos a uma casa lotérica e pedimos um bilhete onde apostarei a humilhação que passei perante a sociedade a que vivo, esperando ganhar um premio por isso.

O que se busca é a dignidade, o apreço, o sentimento de ver reparado um sofrimento que não existia até aquele momento. É tentar igualar o “status quo ante” , já que esse nunca mais voltará. Há sentimentos que jamais se apagam, é uma ferida que nunca se cicatrizará.

Vários casos concretos derramam sob nossos olhos, podemos citar como exemplo: uma mãe cuida de seu filho com o maior zelo dando lhe educação, carinho, amor, e na frente de sua casa, um motorista totalmente embriagado com seu carro luxuoso invade a calçada e atropela essa criança deixando-a totalmente impossibilitada pelo resto da vida. Ou, uma pessoa sendo humilhada em uma loja por causa da sua cor. Será que a cor de um ser humano lhe proíbe de entrar ou sair de determinado lugar? Será que essa criança queria ficar assim? Será que uma ação contra esse motorista que nada sofreu com o acidente, pois seu carro estava todo protegido com os quites de segurança poderia ser considerada como loteria? J a m a i s.

Casos como esse abarrota os Tribunais do Brasil, na esperança de ao menos um respaldo digno para um sofrimento concreto, é como tentar achar uma luz para clarear a escuridão.

Nada se compara com a dor sofrida ou a perda de um ente querido, assim como a agressão à imagem de uma pessoa na praça por erro de um estabelecimento comercial. Só poderemos prever o sofrimento quando nos bate a porta e sentimos na pele cada segundo desse impiedoso momento.

Correto seria prever a compensação da melhor forma possível, aplicando a este causador uma correção que o iniba de praticar tal ato novamente, do mesmo modo é preciso que essa indenização não seja alta demais que acabe enriquecendo ilicitamente o lesionado. Difícil seria aplicar uma penalidade dessas a uma instituição bancária, ou a uma grande empresa, uma vez que muitas vezes o valor arbitrado a esses grupos, poderia gerar enriquecimento sem causa a parte requerente, no entanto ao mesmo tempo, também não pode ser inferior a certo ponto que não chegue a penalizar o causador do dano, deixando assim de atingir o equilíbrio entre o dano e a reparação.

Neste contexto, alguns doutrinadores vêm estudando uma outra forma de aplicar a indenização, buscando compensar o lesionado com um valor que não o torne “rico ilicitamente”, mas que atinja de tal forma o réu, que este jamais volte a cometer tal ato, assim, o causador do dano pagaria um valor a sua altura que o inibisse de novamente cometer tal ato, e o lesado receberia uma quantia que não o tornasse rico ilicitamente.

Desse modo, uma grande empresa, por exemplo, que fosse condenada a uma quantia significativa teria cumprido sua obrigação, no entanto, esse valor tornaria o ofendido rico ilicitamente. Nesse caso, uma parte desse montante iria para o lesado e a outra parte seria distribuída para entidades assistenciais em proporções para cada uma. Assim, o causador do dano seria penalizado e o lesado receberia sua indenização equivalente pelos danos sofridos.

Mister se faz, almejarmos a justiça no todo, levando a todos o que é seu, aplicando a penalidade que caiba. Só não podemos comparar um caso de tamanha proporção com um jogo qualquer pelo simples fato de receber ou não algum valor pela ofensa que lhe foi proporcionado, pois o valor em moeda tem múltiplos efeitos, além de ser a forma mais fácil de compensar essa dor, já que o agente poderá por meio desta buscar a melhor forma de tentar compensar o que esta sentindo.


Notas do texto:


[1] A meu ponto de vista sou totalmente convicto de haver Dano Moral contra Pessoa Jurídica, apesar de ser grande a divergência sob esse assunto.

[2] SILVA, Wilson Melo da. O dano moral e sua reparação. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983. P. 1.

[3] Loteria: Jogo de azar em que se vende grande quantidade de bilhetes numerados, subdivididos em frações (décimos ou vigésimos), alguns dos quais, determinados por sorteio, dão aos portadores direito a um prêmio em dinheiro. 2 Rifa. 3 Espécie de jogo de cartas. 4 fig Coisa ou negócio que depende do acaso. L. esportiva: modalidade de aposta baseada nos resultados de jogos de futebol. Var: lotaria. (Resposta extraída do CDRom gratuito enviado pela UOL (Universo On Line) contendo o “DICMAXI Michaelis Português – Moderno Dicionário da Língua Portuguesa”).

Fonte: Escritório Online


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