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Prisão civil do depositário infiel: inconstitucionalidade superveniente frente à Emenda Constitucional nº 45

18/05/2005
 
Paulo Alberto Carneiro da Costa Filho



A Constituição Federal de 1988 estabelece em seu artigo 5º, LXVII, que "não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel". Todavia com a edição da emenda constitucional nº 45, a prisão civil do depositário infiel mostra-se inconstitucional, havendo um choque de normas constitucionais.

Isto porque, ao introduzir no seu artigo 5º o parágrafo terceiro[1] , a emenda dá status de emendas à constituição aos tratados internacionais de direitos humanos em que o Brasil for signatário. Tal fato se deve a crescente preocupação com a dignidade da pessoa humana, e na garantia efetiva de seus direitos, direitos que são indivisíveis e universais. Nesse contexto, nasce uma nova disciplina, o Direito Internacional Constitucional, que visa expandir essa temática para todos os sistemas jurídicos nacionais, além criar uma linha comum de tratamento.

Assim, o Brasil como país integrante do "Pacto de São José da Costa Rica"[2] , e tendo em vista a edição da referida emenda, a prisão civil do depositário infiel revela-se inconstitucional. Vale salientar, que na verdade a emenda nº 45 veio sacramentar posição que os maiores doutrinadores constitucionalistas do país já adotavam com a interpretação do parágrafo 2º do artigo 5º da Carta Magna[3] , pois, seria a interpretação que se situaria em absoluta consonância com a ordem constitucional de 1988, no tocante ao tratamento dos direitos e garantias fundamentais.

Entretanto, a posição do STF é em total descaminho com a nova égide que se perfaz, entendendo que "inexiste, na perspectiva do modelo constitucional vigente no Brasil, qualquer precedência ou primazia hierárquico-normativa dos tratados ou convenções internacionais sobre o direito positivo interno (...), Diversa seria a situação, se a Constituição do Brasil - à semelhança do que estabelece hoje a Constituição Argentina, no texto emendado pela Reforma Constitucional de 1994 (arts. 75, n.22) - houvesse outorgado hierarquia constitucional aos tratados celebrados em matéria de direitos humanos..."[4] . Porém, data vênia, o egrégio tribunal não optou pela linha interpretativa mais favorável a proteção aos direitos humanos. Que se diga: tal elevação dos tratados internacionais de diretos humanos a status de emenda a constituição jamais fere a soberania do país, pois, quando se trata de direitos humanos a mesma deve ser relativizada.

Para os que defendem cruelmente a soberania ilimitada, há de se inferir que os direitos humanos fundamentais jamais podem ser restringidos ou transgredidos com o argumento de se estar ferindo a soberania de um país, haja vista, que a comunidade internacional deve tratar os direitos humanos de forma global. No tocante a prisão civil do depositário infiel, tal opção político-legislativo do constituinte está muito mais para atender a interesses escusos do que para efetivamente garantir o equilíbrio da ordem social e as relações jurídicas.

Assim, com a edição da emenda 45, as cortes judiciárias do país precisarão rever seus conceitos, em detrimento de agora haver por definitivo o cumprimento efetivo dos tratados, não tendo outro caminho a ser seguido para aqueles que ainda negam tal assertiva, ainda mais se levarmos em consideração o princípio da aplicabilidade imediata das normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais[5] .

Isto posto, surge outra questão que precisa ser esclarecida: como resolver então, um choque notório e inconfundível de normas constitucionais? Vale dizer: o artigo 5º, LXVII, e o introduzido parágrafo 3º da emenda. Como resposta, estando ambas no mesmo patamar hierárquico, tem-se o principio da lei posterior revoga a anterior. Há ainda de colocar, que em se tratando de normas de direitos humanos, prevalecerá o tratado, pois, deve-se optar pela interpretação que dê maior efetividade às normas e princípios fundamentais.

Outrossim, realizando uma interpretação sistemática, os direitos humanos fundamentais são considerados "clausulas pétreas", devendo, portanto, sempre serem ampliados, e jamais restringidos ou abolidos. Punir o cidadão com prisão civil por dívida, salvo o caso de alimentos, é um total descompasso com os princípios norteadores dos direitos humanos fundamentais, e com a concepção moderna do constitucionalismo.
Desta forma, a inconstitucionalidade da prisão civil do depositário infiel, está escancarada, fato superveniente, que deve por definitivo passar a ser visto pelos julgadores. Espera-se, que no raiar de uma nova perspectiva de tratamento aos direitos humanos, o respeito a este bem jurídico fundamental seja garantido. Essencial, para tanto, deve-se haver uma interação entre o direito internacional e direito interno, ao revés, do distanciamento observado. E que não se esqueça: O "Pacto de São José da Costa Rica", é um tratado internacional, debatido e finalizado na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, em San José de Costa Rica, em 22 de novembro de 1969 e ratificado pelo Brasil em 25 de setembro de 1992.
Notas do texto:

[1] Dispõe a emenda 45, in verbis: "§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais"

[2] O Pacto de São José em seu artigo 7º, ponto 7, diz: "Ninguém deve ser detido por dívidas. Este principio não limita os mandatos de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar".

[3] Parágrafo 1º da Constituição Federal: "as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicabilidade imediata", e parágrafo 2º: "os direitos e garantias expressos nesta constituição não excluem outros decorrentes do regime e princípios por ele adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte".

[4] Trecho retirado do julgamento de Habeas Corpus 72.131-RJ, de 22/11/1995, ao enfrentar a questão concernente ao impacto do Pacto de São José da Costa Rica, em seu artigo 7º, VII.

[5] PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o direito constitucional internacional. São Paulo: Max Limonad, 2004.

Fonte: Escritório Online


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