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Escritório Online :: Artigos » Ensaios, Crônicas e Opiniões


A eficácia de uma lei

27/06/2005
 
Wilson Paganelli



O ilustre doutrinador Antônio Carlos Cintra do Amaral, in "Positivismo Jurídico", Instituto dos Advogados de Pernambuco, 2000, ao fazer a distinção entre validade e eficácia da norma jurídica, embasou-se em conceituação do grande pensador do direito e clássico - Kelsen - que nos ensinou:

"(...) a eficácia, ou seja, a realização fática da conduta humana contida na norma, distingue-se de sua validade. A norma pode existir, isto é, ser válida, embora permaneça ineficaz, se bem que uma norma sem um mínimo de eficácia não seja válida, já que esse mínimo de eficácia é condição de sua validade".

Dessarte, validade e vigência equivalem-se. Contudo, a validade ou a vigência de uma norma jurídica distingue-se de sua eficácia. Poderia uma lei existir, ser válida, sem que ainda seja vigente? Do estrito conceito kelseniano, podemos afirmar, seguindo outros autores, que, se a lei não vige, não existe; que ela só adquire existência com sua vigência. Vigendo, passa a ser válida.

Quando, v.g., uma administração cria tributo, ou o altera, por força do princípio constitucional da anterioridade, ele só poderá ser cobrado do contribuinte no exercício financeiro seguinte, ou seja, subseqüente ao da publicação que o criou ou o alterou, conforme dicção do artigo 150, inciso III, letra "b", da nossa Carta Magna. Assim, uma lei tributária só tem existência, só tem validade, quando o tributo a que ela se refere passa a ser cobrado. Então, concluímos, na hipótese, que a lei tributária existe. Caso venha a ser revogada ou anulada, deixa de existir. Na suposição de não o ser, entra em vigor no primeiro dia do exercício subseqüente ao de sua publicação.

Com base no argumento supracitado, ilustre Professor de Direito Administrativo da PUC-MG, Carlos Pinto Coelho Mota, in Aplicação Temporal da Lei de Responsabilidade Fiscal, preleciona que, sob seu ponto de vista, seria acertado distinguir validade e vigência. Segundo ele, válida é a norma legal que existe no mundo jurídico; vigente é a norma legal juridicamente eficaz. Reiteramos: vigente é a norma legal juridicamente eficaz.

A inteligência do Mestre citado remete-nos a um terceiro conceito (além daqueles - validade e eficácia fática), qual seja, o conceito de eficácia jurídica, que se consubstancia na aptidão para produzir efeitos jurídicos., para produzir relações jurídicas concretas. Assim, uma norma pode ser válida e temporariamente ineficaz. É inadmissível, segundo o Mestre, uma norma jurídica perder a validade e continuar juridicamente eficaz.

Citemos como exemplo, contrato por prazo de doze meses, como de prestação de serviço. Dado o lapso temporal nele preconizado, extingue-se o contrato, perde a validade, deixa, portanto, de ser eficaz. Notório em último ano de mandato de governantes que contratos tenham como termo a data de 31 de dezembro. Quem assume em 1º de janeiro não pode prorrogá-lo, visto que está extinto e não se prorroga o que não existe.

Por outro lado, o motivo maior deste artigo é enfocar o assunto de ângulo diferente. A Lei Federal 101/2000, mais conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu artigo 74, estabelece como início de sua vigência a data de sua publicação, no caso, 5 de maio de 2000. De acordo com o artigo 6º da Lei de Introdução ao Código Civil, a lei, entrando em vigor, possui efeito imediato e geral, respeitado o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

Essa mesma lei estabelece em seu artigo 21 e em seu parágrafo único:

"Art.21 - É nulo de pleno direito o ato que provoque aumento da despesa com pessoal e não atenda:
I- as exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei Complementar, e o disposto no inciso XIII do art. 37 e no parágrafo 1º do art. 169 da Constituição;
II- o limite legal de comprometimento aplicado às despesas com pessoal inativo.
Parágrafo Único- Também é nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20.


Bem, vejamos então, para melhor esclarecimento, quais são as exigências dos artigos 16 e 17 da LRF, citadas no inciso I do artigo 21. Diz o artigo 16 que a criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa terá que ser acompanhado da estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes, além de haver, necessariamente, declaração do ordenador de despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias. O artigo 17 considera, em síntese, obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a dois exercícios. No seu parágrafo primeiro, o artigo 17 reitera que atos que criem ou aumentem despesa têm que ser instruídos com a estimativa prevista no 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.

Não é novidade o que ocorreu em muitas Prefeituras: no apagar das luzes, o Prefeito Municipal enviou Lei à Câmara Municipal, que aprovou e o Alcaide promulgou, sancionou, na qual havia aumento de despesa com pessoal.

Ora, dois aspectos a serem relevados: primeiramente, quem assim agiu, tanto Prefeito quanto Vereadores que aprovaram, infringiram a Lei 101/00, que estava e está em vigência, justamente no artigo 21 e, mormente, seu parágrafo único; se infringiu também os incisos I e II do citado artigo, agrava-se mais ainda; em segundo lugar: se o Prefeito que assumiu o cargo em 1º de janeiro, estando ela apenas válida, mas temporariamente ineficaz, praticou atos baseados nela, tornou-a válida e eficaz, qual seja, fez produzir relações jurídicas concretas. Juntamente com o Prefeito e Vereadores da legislação finda, assumiu responsabilidades, infringindo a LRF, que, se cobrada por algum cidadão...!!! Agora, se houve a aprovação por parte da Câmara Municipal (indevida, porque a Comissão de Justiça e Redação nem deveria ter aceitado o projeto, posto que ilegal, ou seja, confrontava com o preconizado pela LRF), promulgação pelo Prefeito que, ao sair, não teve tempo de a pôr em prática e, em o Prefeito sucessor assumindo, não tenha praticado atos que lhe dessem relações jurídicas concretas, não permitindo sua eficácia, evidentemente, não poderá ser responsabilizado, num eventual questionamento.

Ademais, entendemos - apesar de ser convicção nossa - que, em sendo a Lei 101/00 uma Lei federal e, some-se, Lei Complementar, é, hierarquicamente, sem dúvida, superior a qualquer lei ordinária, mormente, ainda, a uma lei municipal. E como nela - LRF - consta, cristalinamente, que é nulo de pleno direito o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20, atos baseados na Lei aprovada pela Câmara Municipal e sancionada pelo Prefeito anterior, dentro dos 180 dias proibitivo, estão fulminados pela ilegalidade, conforme ela própria determina: É NULO DE PLENO DIREITO O ATO DE QUE RESULTE (...). E se não teve eficácia, ou seja, não houve relações jurídicas concretas advindas dela, ineficaz se tornou também. Deve ser revogada pois, ou pedida sua nulidade. E a LRF tem, como um dos seus objetivos, justamente esse: evitar que, no apagar das luzes, Prefeito, com a aquiescência da Câmara, queira deixar marca pessoal! Nada de abuso ou irresponsabilidade!

E, embora haja entendimentos contrários, o parágrafo primeiro do artigo 1º da LC 101/00 é claro: a responsabilidade na gestão fiscal pressupõe ação planejada e transparente, em que se PREVINEM riscos e se CORRIGEM desvios capazes de afetar o equilíbrio das contadas públicas... Basta que haja aumento de despesa, é requisito essencial o cumprimento do que determina o artigo 16 em seus incisos I e II, sob pena de nulidade preconizada pelo artigo 21. Assim, em nosso entendimento, o espírito da Lei, a vontade do Legislador é fazer com que o ordenador de despesas deixe transparentes os atos de que resultem aumento de despesa, mormente com pessoal, justamente para que o órgão fiscalizador possa também controlar o avanço das despesas. Daí os limites estabelecidos de 10% (artigo 71) e os 54% para o Executivo (art. 20). Não fosse esse o entendimento, o Legislador Pátrio teria explicitado em norma que os procedimentos exigidos pelos artigos 16 e 17 só deveriam ser efetuados se os limites fossem atingidos ou ultrapassados. Enfim, qualquer lei que não atenda o estabelecido legalmente pela LRF (estimativa de impacto, declaração do ordenador de despesa, premissas e metodologia dos cálculos utilizados) está fulminada pela nulidade. Aliás, reitere-se, em se levando em conta a hipótese acima, nem poderia ser votada, como ocorreu em alguns municípios em 2004. É isso aí!

Fonte: Escritório Online


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