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Escritório Online :: Artigos » Direito Civil


Breves comentários sobre o abuso de direito

29/09/2005
 
Bruno Nascimento Coelho



Inicialmente apresentamos como conceito ao abuso de direito o exercício de um direito subjetivo ou outras prerrogativas individuais, de maneira exacerbada, ou seja, de modo desconforme aos limites estabelecidos pelos fundamentos axiológico-normativos inerentes ao direito ou prerrogativa individual exercitada. Nas palavras de Clovis Bevilaqua, autor do Código Civil de 1916, as melhores consciências, desde muito tempo, sentiam que o direito deveria ser exercido dentro de certos limites éticos, com fundamento na idéia moral da sociedade humana e na tendência à socialização do exercício, sendo, nesse contexto, impositiva a proibição do abuso.

Dentro da atual doutrina pátria, com o advento do Código de 2002, uma divergência, dentre várias, distribuiu os autores dentre adeptos da Teoria Subjetiva e partidários da Teoria Objetiva.

Os que seguiam a linha subjetivista, como Washington de Barros Monteiro, entendiam o elemento intencional como impreterível à caracterização do abuso de direito, defendendo que “a teoria do abuso de direito é a mesma teoria da responsabilidade civil fundada na culpa”.

Dentro na vertente subjetivista, contudo, a postura que mais sobressaiu, influenciando, inclusive, a jurisprudência dos nossos tribunais, foi a que exigia, para além da culpa, entendida esta como um dos graus da culpabilidade, a existência de um fim específico, de um “ânimo mau” caracterizado na intenção de causar prejuízo a outrem via exercício do direito subjetivo. De acordo com o ressaltado por Rui Stoco, os doutrinadores previam, com arrimo na teoria italiana da aemulatio, o concurso de quatro pressupostos para a configuração do ato emulativo:

a) o exercício de um direito; b)que desse exercício resultasse um dano a terceiro; c) que o ato realizado fosse inútil para o agente; d)que a realização fosse determinada exclusivamente pela intenção de causar um dano a outrem.

A Teoria Objetiva, por sua vez, não dispensou à culpabilidade (em qualquer grau), caráter de elemento do abuso de direito. Bastaria para a configuração de um ato como abusivo, a irregularidade no exercício do direito ou o desvio da finalidade social para a qual ele foi concebido ou ainda a inexistência de interesse legítimo na sua realização. Por todos, colacionamos o entendimento de Sílvio Sálvio Venosa:

A problemática surge quanto ao modo de se fixar no caso concreto o abuso. A dúvida maior é saber se por nossa legislação há necessidade do animus de prejudicar, ou se o critério objetivo da pouca valia do ato para o agente pode ser utilizado. Preferimos concluir, aderindo a parte da doutrina, que o melhor critério é o finalístico adotado pelo direito pátrio. O exercício abusivo de um direito não se restringe aos casos de intenção de prejudicar. Será abusivo o exercício do direito fora dos limites da satisfação do interesse lícito, fora dos fins sociais pretendidos pela lei, fora, enfim, da normalidade.

Frente aos conceitos apresentados, em uma análise jurisprudencial, há de se observar uma nítida adoção a teoria objetiva dentro do abuso de direito, como é observada na decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) abaixo transcrita:

Direito civil. Ação de indenização por danos morais. Duplicata
levado a protesto com equivocado número de CNPJ. Operação de
desconto. Art. 13, § 4º, da Lei n. 5.474/68. Ausência de verificação
da regularidade da duplicata. Abuso de direito. - O banco que recebe duplicata em operação de desconto e leva-a a protesto sem verificar devidamente a sua regularidade comete ato abusivo e responde pelos prejuízos causados a terceiro de boa-fé. Precedentes. Recurso especial conhecido e provido.
(REsp 456088 / GO, Min. Nancy Andrighi)

Idem, pode-se dizer do acórdão Ag 520678 / RS, também do STJ:

PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - NEGATIVA DE PROVIMENTO - AGRAVO REGIMENTAL - CONSUMIDOR - INSCRIÇÃO NO CADASTRO DE INADIMPLENTES - DISCUSSÃO DO MONTANTE DA DÍVIDA EM JUÍZO - ABUSO DE
DIREITO - SÚMULA 83/STJ - DESPROVIMENTO. 1 - Este Tribunal já proclamou o entendimento no sentido de que o registro do nome do consumidor, como devedor inadimplente, no Serviço de Proteção ao Crédito, quando o valor da dívida está sendo discutido em juízo, representa abuso de direito. Precedentes (Resp nºs 191.326/SP e 170.281/SC). 2 - Aplicável, portanto, à hipótese, o enunciado sumular de nº 83/STJ. 3 - Agravo Regimental conhecido, porém, desprovido.
(Ag. 520678 / RS, Min Jorge Scartezzini)

O mesmo pode se dizer sobre a Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, nos acórdãos ACJ 218028 e ACJ 216956, abaixo transcritos, respectivamente:

CIVIL. SERVIÇOS DE TELEFONIA CELULAR. INADIMPLÊNCIA INEXISTENTE. SUSPENSÃO DOS SERVIÇOS. ABUSO DE DIREITO. CLONAGEM DO APARELHO MÓVEL. RISCO DA ATIVIDADE. CASO FORTUITO DESQUALIFICADO. DANO MORAL. CARACTERIZAÇÃO. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA DEVIDA. 1. A "CLONAGEM" DE APARELHO MÓVEL CELULAR, CONSUBSTANCIANDO-SE EM FATO INTEIRAMENTE ESTRANHO PARA O CONSUMIDOR A QUEM PERTENCIA, SE INSCREVE DENTRE OS RISCOS PRÓPRIOS E AFEITOS À EXPLORAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TELEFONIA, ELIDINDO SUA QUALIFICAÇÃO COMO CASO FORTUITO OU FORÇA MAIOR PASSÍVEIS DE AFASTAREM A RESPONSABILIDADE E CULPA DA OPERADORA DE TELEFONIA PELA SUA OCORRÊNCIA, ENSEJANDO SUA QUALIFICAÇÃO COMO A ÚNICA CULPADA E RESPONSÁVEL PELO QUE SE VERIFICARA E PELAS CONSEQÜÊNCIAS QUE DELE EMERGIRAM. 2. CARENTES DE ESTOFO LEGAL E DESPROVIDOS DE QUALQUER INICIATIVA PROVENIENTE DO USUÁRIO, A SUSPENSÃO DOS SERVIÇOS DE TELEFONIA E BLOQUEIO DA LINHA HABILITADA EM SEU NOME POR PARTE DA OPERADORA DE TELEFONIA, VULNERANDO SUA INTANGIBILIDADE PESSOAL, DEIXANDO-O CARENTE DOS SERVIÇOS QUE CONTRATARA E SUJEITANDO-O AOS CONSTRANGIMENTOS, ABORRECIMENTOS, DISSABORES, INCÔMODOS E HUMILHAÇÕES DE SER TRATADO COMO INADIMPLENTE E CONSUMIDOR REFRATÁRIO AO CUMPRIMENTO DAS OBRIGAÇÕES QUE LHE ESTÃO DESTINADAS, QUALIFICAM-SE COMO OFENSA AOS SEUS ATRIBUTOS DA PERSONALIDADE E AOS SEUS PREDICADOS INTRÍNSECOS, RESTANDO CARACTERIZADO QUE O DANO MORAL QUE EXPERIMENTARA É APTO A GERAR UMA COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA. 3. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. UNÂNIME. (ACJ 218028, 1.ª Turma Recursal no Juizado Especial Cível e Criminal do DF. Rel.: Teofilo Rodrigues Caetano Neto).


RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. CONSÓRCIO. CARTA DE CRÉDITO. DEMORA NA LIBERAÇÃO. RETARDAMENTO IRRISÓRIO. MERO DISSABOR. PREJUÍZO MATERIAL NÃO DEMONSTRADO. 1. OS ABORRECIMENTOS, PERCALÇOS, FRUSTRAÇÕES E VICISSITUDES PRÓPRIOS DA VIDA EM SOCIEDADE NÃO SÃO PASSÍVEIS DE SE QUALIFICAREM COMO OFENSA AOS ATRIBUTOS DA PERSONALIDADE E FATOS GERADORES DO DANO MORAL, AINDA QUE TENHAM IMPREGNADO NO ATINGIDO PELO OCORRIDO CERTA DOSE DE AMARGURA, POIS SUA COMPENSAÇÃO NÃO TEM COMO OBJETIVO AMPARAR SENSIBILIDADES AFLORADAS OU SUSCEPTIBILIDADES EXAGERADAS, ELIDINDO A QUALIFICAÇÃO DE SIMPLES INADIMPLEMENTO CONTRATUAL OU TRANSTORNO CASUAL COMO PASSÍVEIS DE GERÁ-LO. 2. ELIDIDO O ABUSO DE DIREITO IMPUTADO E ENQUADRANDO-SE DENTRO DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE, PEQUENO RETARDAMENTO HAVIDO NA LIBERAÇÃO DE CARTA DE CRÉDITO A CONSORCIADA CONTEMPLADA ENQUADRA-SE COMO FATO ORDINÁRIO E IMPREGNADO NAS NUANÇAS DA VIDA EM SOCIEDADE E DOS RELACIONAMENTOS CONTRATUAIS, NÃO SE CONSUBSTANCIANDO EM FATO DE GRAVIDADE SUFICIENTE PASSÍVEL DE LEGITIMAR SUA QUALIFICAÇÃO COMO DANO MORAL E DE GERAR UMA COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA. 3. O DANO MATERIAL, AO CONTRÁRIO DO QUE SUCEDE COM O DANO MORAL PURO, SOMENTE SE IMPLEMENTA EM TENDO SE VERIFICADO O DESFALQUE QUE AFETARA O PATRIMÔNIO DO LESADO, IMPLICANDO EM DIMINUIÇÃO PATRIMONIAL EFETIVA, E SUA COMPOSIÇÃO DEVE GUARDAR ESTRITA CONFORMIDADE COM A PERDA HAVIDA, DE FORMA A LHE SER ASSEGURADA A JUSTA RETRIBUIÇÃO PELO ILÍCITO QUE O VITIMARA, ENSEJANDO A ILAÇÃO DE QUE, NÃO EVIDENCIADO O FATO DO QUAL TERIA GERMINADO E NEM O PREJUÍZO DELE ORIGINÁRIO, RESTA DESPROVIDO DE LASTRO MATERIAL SUBJACENTE, INVIABILIZANDO O IMPLEMENTO DO SILOGISMO NECESSÁRIO À GERMINAÇÃO DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. 4. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. UNÂNIME. (ACJ 216956, 1.ª Turma Recursal no Juizado Especial Cível e Criminal do DF. Rel.: Teofilo Rodrigues Caetano Neto).

Sem a menor sombra de dúvida, o critério objetivo para a apuração do abuso de direito é bastante pragmático. Eficiente dentro de suas próprias limitações, não descartando aspectos subjetivos, no que se refere a análise de culpabilidade do agente. Há de se considerar que o posicionamento dos tribunais em valerem-se deste critério, a nosso ver, atende a atual demanda, numerosa, de ações judiciais impetradas desnecessariamente, maculado o direito pátrio com futilidades e abusos nocivos ao Estado democrático de direito.


BIBLIOGRAFIA


ALVES, Isabela Sampaio. Regime jurídico do abuso de direito à luz do novo Código Civil. Artigos Jurídicos, Disponível em :< http://www.advogado.adv.br/artigos/2003/isabelasampaioalves/regimejuridico.htm>. Acesso em 08 jul.2005.

BARROS, João Álvaro Quintiliano. Abuso de direito . Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 727, 2 jul. 2005. Disponível em: . Acesso em: 08 jul. 2005.

CAVALIERI F., Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Malheiros, 2005.

PETEFFI DA SILVA, Rafael. Responsabilidade civil. Palhoça: UNISULVirtual, 2005.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil – volume IV – Responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2005.

Fonte: Escritório Online


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