A velocidade do crescimento das cidades resultou na falta da acomodação espacial da população. Como solucionar a questão espacial com o uso de processos arcaicos, planejamentos de gabinete e decisões a custas de interesses da classe dominante? O caminho é a construção de um novo paradigma, um planejamento que objetive o desenvolvimento sustentável das cidades.
Em 1988 a Constituição Federal cria o Plano Diretor (PD), instrumento que emerge a partir da dialética: A ocupação do espaço e a indissociabilidade entre o urbano e rural. Segundo Le Corsubier (1975), "urbanismo é a ciência da organização do espaço, para além das restritas fronteiras das cidades". Portanto, cabe ao gestor público ter uma visão sistêmica do município.
Porque PD? Plano por traçar os objetivos e fixar seus prazos; estabelecer as atividades e definir sua execução. Diretor, por fixar as diretrizes do desenvolvimento urbano do Município. (SILVA, 1997). O PD além de considerar o município como um todo, deve definir a função social da propriedade e ser concebido a partir de ampla participação popular.
Neste contexto, a Cidade atinge ao patamar constitucional, bem como a lei maior passou a prever a obrigatoriedade do PD, que deverá ser aprovado pela Câmara municipal. (LIRA, 1997). Por este motivo, dos 5.507 municípios brasileiros (IBGE: Censo, 2000), 1.700 deles, por definição em lei, terão de aprovar os seus planos diretores até outubro próximo.
Nesta escalada, em 2001, após exaustiva pressão popular, que durou 11 anos, foi aprovada a Lei 10.257 "Estatuto da Cidade", que ainda se mostra em fase de discussão hermenêutica. Essa lei surgiu como um instrumento regulamentador dos preceitos constitucionais que trata da temática urbana. Porém, ainda sem efetivos resultados práticos, pela dependência da aprovação dos PDs. Segundo Arruda (2001), "o Estatuto da Cidade não vai, por si só, garantir cidades mais justas. A nova lei traz o instrumental cirúrgico, que pode ser bem usado, ou não, de acordo com a habilidade do cirurgião, no caso as municipalidades". O grande risco deste instrumental regulador é de se tornar "lei que não pegou".
A questão central emergida no bojo desse novo conjunto de leis é o contradito ao paradigma dominante sobre a propriedade absoluta. Neste aspecto o debate é remetido à titularidade do domínio dos imóveis, que é exercido pelos membros da comunidade. Desta maneira, a atitude desses membros, na relação de uso das propriedades privadas, deve ser cidadã, o que não condiz com a atividade especulativa de retenção de terrenos, resultante nos vazios urbanos das cidades. Como explica Borges (1994), "o titular do domínio tem a obrigação com sua comunidade, ou seja, tem de cumprir na condição de titular do domínio a função social da propriedade". Assim, verifica-se que a propriedade privada, com base individualista, cedeu definitivamente o espaço para a propriedade de finalidade social, enquanto que por imposição legal esta somente se justifica quando cumprir a dita função social. (HARADA, 2004). Neste contexto a essência da discussão é a questão epistemológica da cidadania enquanto essência da cidade.
O PD concebido em gabinete, sem participação popular e tendo como resultado cartas temáticas delimitadoras de espaços de uso e ocupação do solo, deu espaço a uma nova concepção didática de formulação, ou seja, o estabelecimento de um novo paradigma, possibilitando que a população participe efetivamente da sua discussão, resultado, nos dias atuais, da politização da massa e conseqüente reafirmação da cidadania e respeito à função social da cidade. (HARADA, 2004).
Bibliografia:
[1] ARRUDA, Inácio. Estatuto da Cidade: E Agora? - São Paulo, 2001.
[2] BORGES, Paulo Torminn. Institutos Básicos do Direito Agrário. São Paulo: Saraiva, 8. ed., 1994.
[3] CORBUSIER. Le. Princípios de Urbanismo. La Carta de Atenas. Barcelona: Ariel, 1975.
[4] HARADA, Kiyoshi. Direito Urbanístico: Estatuto da Cidade: Plano Diretor Estratégico. São Paulo: NDJ, 2004.
[5] LIRA, Ricardo Pereira. Elementos de direito urbanístico. Rio de Janeiro: Renovar, 1997.
[6] SILVA, José Afonso da. Direito Urbanístico Brasileiro. 2 ed. São Paulo: Malheiros, 1997.
Fonte: Escritório Online
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