A crise de energia elétrica ajudou a Agência Nacional de Águas (ANA) a tirar do papel seu mais ambicioso projeto: cobrar pelo uso dos rios. A partir deste ano, quem captar água de qualquer bacia hidrográfica brasileira vai pagar, e o custo será bem maior para os poluidores. A taxação foi autorizada pelo Congresso em 1997, mas até o final do ano passado não havia disposição para fixar o preço. A agência tinha dificuldades na colocação do tema em pauta, principalmente para tratar de aumento de custos de empresas e de agricultores. “Nossa missão foi facilitada pelo racionamento”, diz Jerson Kelman, presidente da ANA. “A falta de energia projetou a importância de racionalizar o uso de um bem finito.”
O esquema de cobrança vai começar pela Bacia do Rio Paraíba do Sul, que corta os mais importantes Estados do País – São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Nos 180 municípios envolvidos pelo Paraíba do Sul estão concentrados 13% do Produto Interno Bruto (PIB), distribuídos em oito mil indústrias e 5,2 milhões de habitantes. A partir de março, os consumidores da bacia serão convocados a fazer um cadastramento. Será usado o modelo semelhante ao da Declaração do Imposto de Renda, isto é, o contribuinte vai informar a quantidade de água usada e sua capacidade de tratamento de resíduos. A tarifa fixada é de R$ 0,02 por metro cúbico, mas quem devolver a água em condições de uso vai pagar mais barato, R$ 0,008. A taxação acrescenta um custo adicional na planilha das empresas, mas, pela cartilha ecológica, será impossível lutar contra essa nova despesa. “É uma obrigação legal. Então, iremos pagar”, diz Luiz Claudio Ferreira Castro, gerente geral de Meio Ambiente da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), sem deixar de registrar o protesto. “Trata-se de uma duplicação de taxas para as indústrias que já investem pesado em meio ambiente.” A reclamação da CSN é fundamentada em cifras. Em dois anos e meio, a empresa gastou R$ 200 milhões em ecoeficiência. Isso ajudou a reduzir pela metade a demanda pela água. Pelas estimativas iniciais, a despesa será acrescida em R$ 3 milhões com a nova tarifa.
Na primeira fase do projeto, apenas os consumidores industriais e as companhias de saneamento serão obrigados a pagar a taxa. O comitê técnico encarregado de estabelecer as regras vai decidir ainda uma metodologia para cobrar dos agricultores e das hidrelétricas. A ordem é cobrar de todos os usuários e a multa para quem tentar escapar da obrigação é pesada, R$ 10 mil por dia. Nos projetos de curto prazo da agência estão ainda três outras bacias que até o próximo ano terão também um sistema de cobrança: São Francisco, Rio Doce e Piracicaba-Capivari-Jundiaí. “Queremos mostrar que é impossível falar em desenvolvimento econômico-social e excluir ações para tratamento de esgotos”, afirma Dilma Seli Pereira, superintendente de Gestão de Recursos Hídricos da ANA. O consolo para os usuários é que todo dinheiro arrecadado será investido na recuperação dos rios. Pelo menos, por enquanto.
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