Nos termos do art. 366, caput, do Código de Processo Penal (CPP), com redação da Lei n. 9.271, de 17 de abril de 1996, “se o acusado,” encontrando-se no território nacional, “citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312”.
E se o acusado estiver em território estrangeiro?
Aplica-se o disposto no art. 368 do mesmo estatuto, também com redação da Lei n. 9.271/96: “Estando o acusado no estrangeiro, em lugar sabido, será citado mediante carta rogatória, suspendendo-se o curso do prazo de prescrição até o seu cumprimento”.
Antes da lei nova, encontrando-se o réu em lugar sabido fora do nosso território, desde que processado por delito inafiançável, a citação era feita por carta rogatória[1] ; afiançável o crime, em lugar conhecido ou não, por edital. Como 70% das rogatórias não eram e não são cumpridas, notando-se que as atendidas demoram, no mínimo, dois anos, muitos processos eram atingidos pela prescrição da pretensão punitiva, considerado o máximo da pena abstrata[2] . Levando em conta esse fator de impunidade, o legislador, na lei nova, pouco importando se afiançável ou não o delito, determina que a citação do réu, estando no estrangeiro em lugar conhecido[3] , se faça mediante rogatória, “suspendendo-se o curso do prazo prescricional até o seu cumprimento”. Criou-se mais um caso de suspensão do prazo de prescrição da pretensão punitiva, acrescido ao rol do art. 116 do Código Penal (CP).
A lei simplesmente impõe a suspensão da prescrição, sem limitar o prazo. Assim, se não cumprida a rogatória, por quanto tempo pode ficar impedido o decurso do prazo prescricional? Cumprida a rogatória dezenas de anos depois da sua expedição, poderá prosseguir a ação penal?[4]
Como não há prazo legal para cumprimento da rogatória[4] , a solução afirmativa à última questão, decorrendo da interpretação literal da lei, não nos parece justa. Se um dos fundamentos da prescrição penal reside na inércia da autoridade[6] , que não encerra o processo dentro dos prazos legais, impondo como castigo a extinção da punibilidade, a suspensão indefinida do prazo ofende o princípio da igualdade das partes. Permitindo-se a suspensão da prescrição sem limite temporal, esta, não cumprida a carta rogatória, jamais ocorreria, encerrando-se o processo somente com a morte do réu ou outra causa extintiva da punibilidade. Se o Estado perde, pelo decurso do tempo, a pretensão punitiva, não é lógico que, diante da expedição da rogatória não cumprida, pudesse exercê-la indefinidamente. Por isso, entendemos que deve ser adotada a mesma orientação sugerida em relação ao art. 366 do CPP: o limite da suspensão do curso prescricional, na hipótese do art. 368 do CPP, corresponde aos prazos do art. 109 do CP, considerando-se o máximo da pena privativa de liberdade imposta abstratamente ao delito. Assim, por exemplo, expedida carta rogatória em processo por crime cujo prazo prescricional da pretensão punitiva é de oito anos, o impedimento do curso prescricional tem o termo máximo de oito anos, i. e., o prazo prescricional da pretensão punitiva só pode ficar suspenso até oito anos. Nesse limite, recomeça a ser contado o lapso extintivo, que é de oito anos, computando-se o tempo anterior à suspensão. Se, para admitir a extinção da punibilidade pela prescrição, o legislador entendeu adequados os prazos do art. 109, da mesma forma devem ser apreciados como justos na disciplina do prazo da suspensão do decurso prescricional.
Notas do texto:
[1] Art. 783 do CPP.
[2] CP, art. 109.
[3] A citação também pode ser realizada em legações e embaixadas.
[4] É conhecido o caso do agente que foi processado 52 anos depois do fato.
[5] Não se referem a prazo: os arts. 783 e ss. do CPP; a Convenção Interamericana sobre Cartas Rogatórias (1975) e seu Protocolo Adicional (1979); a Portaria n. 26, de 14 de agosto de 1990, do Chefe do Departamento Consular e Jurídico do Ministério das Relações Exteriores e do Secretário Nacional dos Direitos da Cidadania e Justiça do Ministério da Justiça; o Decreto n. 1.899, de 9 de maio de 1996, e o Decreto n. 2.022, de 17 de outubro de 1996.
[6] BARROS, Oscar Vera. La prescripción en el Código Penal. Buenos Aires: EBA, 1960. p. 44.
Fonte: Escritório Online
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